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Maria Ana Castro Caldas de Aboim Inglez

m@aboiminglez.com

Arquiteta e Doutoranda no Departamento de Arquitetura da Universidade Autónoma de Lisboa (DA/UAL), Portugal. CEACT/UAL – Centro de Estudos de Arquitetura, Cidade e Território da Universidade Autónoma de Lisboa, Portugal

 

Para citação:

INGLEZ, Maria Ana Castro Caldas de Aboim – Piscinas de Bellinzona. Paisagem | Arquitetura | Infraestrutura. Estudo Prévio 25. Lisboa: CEACT/UAL – Centro de Estudos de Arquitetura, Cidade e Território da Universidade Autónoma de Lisboa, dezembro 2024, p. 53-108. ISSN: 2182-4339 [Disponível em: www.estudoprevio.net]. DOI: https://doi.org/10.26619/2182-4339/25.2

Artigo recebido a 30 de julho de 2024 e aceite para publicação a 17 de outubro de 2024.
Creative Commons, licença CC BY-4.0: https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/

Piscinas de Bellinzona. Paisagem | Arquitetura | Infraestrutura

 

Resumo

As Piscinas de Bellinzona, de Aurelio Galfetti, Flora Ruchat-Roncati e Ivo Trümpy, resultantes de um concurso público e inauguradas oficialmente em agosto de 1970, constituem um projeto de extremo valor arquitetónico. Construída em território suíço, mais concretamente na região de Ticino, a obra encontra-se listada como propriedade cultural, de importância cantonal, desde 2010.

Pretende-se demonstrar que o projeto procura a identidade do lugar, aliando-se à incessante ideia de convocar mobilidade, apontando caminhos para a sua expansão futura ao suscitar extravasar os limites do programa do concurso. Deseja-se esclarecer que a singularidade da proposta, demostrada na criação de um percurso elevado seis metros acima da planície da intervenção, suplanta, num desenho infraestrutural, os pressupostos de um equipamento público, resolvendo, num gesto dual de continuidade e radicalidade, a ligação territorial entre o vale, Bellinzona e o rio Ticino.

Serão estudadas as contínuas alterações da proposta geral, desde a fase de concurso até à sua construção, através da análise de fontes primárias existentes no Archivio del Moderno, demonstrando que as mesmas assentam sobre depuramentos consubstanciados na incessante dúvida formal. Serão abordadas as inúmeras variantes do perfil do passadiço, desenvolvidas ao longo da evolução do projeto, convocando a sua síntese na procura de significado na arquitetura.  São apresentados ecos e influências, que convocam propostas territoriais, para reforçar a preposição defendida. A análise à obra será reforçada através de uma entrevista realizada, a Nicola Navone, atual vice-diretor do Archivio del Moderno, responsável, com Bruno Reichelin, pela primeira monografia sobre as Piscinas, constituindo uma leitura importante e exaustiva do projeto. A longevidade da obra será observada, verificando-se o que floresceu assim como o que foi suprimido com o tempo, definindo a obra como projeto seminal internacional, ao fundir um trinómio raro de alcançar: Paisagem, Arquitetura e Infraestrutura.

 

Palavras-chave: Piscinas de Bellinzona, Aurelio Galfetti + Flora Ruchat-Roncati + Ivo Trümpy, Paisagem, Infraestrutura.

 

 

1. Difusão

As Piscinas de Bellinzona, de Aurelio Galfetti, Flora Ruchat-Roncati e Ivo Trümpy, inauguradas oficialmente em agosto de 1970, são consequentes de um concurso promovido pelo Município de Bellinzona, que irá decorrer entre abril e agosto de 1967. Apesar de anunciada em jornais locais, a obra só encontra uma primeira relevante publicação no campo da arquitectura, em fevereiro de 1971, no fascículo 58, do número 2, da revista Werk, a principal revista suíça de arquitectura, propriedade da FAS – Federação de Arquitetos Suiços.

A obra, na referida publicação, é apresentada em conjunto com as Piscinas de Lancy e de Zurzach, dos arquitetos Paul Waltenspühl e Fritz Schawarz, respectivamente. Todas as propostas expressam um momento de investimento municipal em equipamentos públicos associados a espaços de lazer, apoiados em estruturas bem integradas e pormenorizadas, onde o betão predomina. Se as propostas de Lancy e Zurzach apontam caminhos mais conservadores, não deixando de manifestar virtuosismo formal, a proposta de Bellinzona extravasa esta componente de resposta ao programa, demonstrando um inovador sentido territorial. Antes desta divulgação, a proposta vencedora é publicada na Rivista técnica [1], em distintos fascículos, com detalhes de carácter informativo.

Figura 1Plantas publicadas na revista Werk, nº 2, fascículo 58, fevereiro de 1971 (Fonte: E-Periodica – Das Werk: Architektur und Kunst = L’oeuvre : architecture et art – Altersheime – Schwimmbäder © Das Werk. 1971, 58 (2))

No intervalo temporal entre a inauguração até à primeira significativa divulgação foi realizada uma primeira tentativa de publicação, sem sucesso, na revista Casabella, através de esforços dirigidos por Bruno Reichlin [2], na altura colaborador externo da revista. Poderá parecer impossível esta rejeição, mas arrisca-se apontar que por vezes as obras que anunciam algo fundamental, necessitam de respirar para serem inteligíveis no seu discurso e serem percetíveis no seu significado.

No artigo da revista Werk elaborado por Diego Peverelli [3], arquiteto também oriundo de Ticino, são publicadas plantas programáticas apoiadas por fotografias impactantes da obra, da sua autoria e Pino Brioschi, que ainda hoje são amplamente difundidas por revelarem uma profundidade de campo que introduz clareza territorial. Deve-se a Bruno Reichlin esta primeira publicação ao apresentar a obra a Diego Peverelli, numa tentativa de suplantar a primeira adversidade editorial.

Figura 2 – Fotografia de Pino Brioschi, 1970 (Fonte: Archivio del Moderno, ALG).

 

 

Poucos anos mais tarde, em 1975, é realizada uma importante exposição na ETH de Zurique, com curadoria de Martin Steinmann [4] e Thomas Boga, intitulada Tendenzen – Neure Architktur im Tessin. A palavra Tendenzen deixava evidente a influência de Aldo Rossi [5], tendo a própria palavra sofrido várias críticas, pela síntese que confere, condensando o seu conteúdo a uma camada uniforme de ideias e significado. O catálogo da exposição, impresso em três edições entre 1975 e 1976, devido à crescente procura, é republicado numa versão facsimile em 2010. O catálogo acompanha a intensa viagem da referida exposição, pela Europa e América do Norte, tendo catapultado a arquitetura de Ticino, construída entre as décadas de1960 e 1970, neste particular cantão suíço, de grande proximidade linguística, cultural e geográfica com o norte de Itália. No conjunto dos 48 projetos, encontram-se as Piscinas de Bellinzona. Os autores do projeto integram um grupo de 21 arquitetos de Ticino, onde se pode salientar também Mario Botta [6], Peppo Brivio, Mário Campi, Tita Carloni, Bruno Reichlin, Fabio Reinhart, Luigi Snozzi [7] e Livio Vacchini [8], entre outros.

Relativamente às obras expostas, que juntam casas particulares, equipamentos escolares e edifícios públicos, alguns ainda em construção, evidencia-se a incorporação de outras obras dos autores das Piscinas, como a Casa Ruchat, em Morbio Inferiori [9], a Escola Primária de Riva San Vitale, o Jardim de Infância Viganello [10], em Lugano, assim como dois projetos apenas da autoria de Aurelio Galfetti, como o Jardim de Infância, em Bedano [11] e a Casa Rotalini [12], em Bellinzona.

O formato em que o projeto das Piscinas se apresenta, sem identificação do seu contexto urbano, social e económico, cumprindo com regras gráficas consentâneas com as restantes propostas, tal como Irina Davidovici nos esclarece no seu recente livro The Autonomy of Theory, Ticino Architecture and Its Critical Reception  [12], poderá ter retirado a sua maior valência, que se pode resumir a uma súmula inteligente de leitura crítica do lugar. As três plantas apresentadas, apenas com indicação de percurso/ cabines/ piscinas, são consequentes das já graficamente depuradas, para a anterior publicação na Werk. A obra começa a ganhar reconhecimento, através de uma composição geométrica intrigante. No entanto poderá ter, neste apelativo grafismo, desvalorizado a sua forte componente territorial, que constitui uma das suas maiores valências.

A exposição e referido catálogo continuam a produzir ecos com contornos míticos, sobretudo nos meios académicos, tendo marcado um momento decisivo na história da arquitetura de Ticino.

A revista L’Architecture d’Aujourd’hui irá publicar, na sua edição de 1977, dois artigos importantes: A crítica, escrita por Francesco Dal Co, em agosto de 1976, à referida exposição Tendenzen e ao catálogo produzido, e consentaneamente um texto denominado critica da critica de Martin Steinmann e Bruno Reichelin. A mesma edição publica a obra acompanhada das repetidas plantas das Piscinas, com algumas fotografias e um resumido texto.

Francesco Dal Co não é consensual, cauteloso ou sequer indireto, mas sim muito crítico nas escolhas dos projetos e na sua pertinência no campo da arquitetura. Escreve que a substância que prevalece é insuficiente, apontando que a “impressão deixada pelas obras realizadas está longe de corresponder ao que foi apresentado no catálogo da exposição Tendenze. Nuove architetture in Ticino. O desfasamento entre a realidade e a sua representação é impressionante. A distância teórica e os esforços ideológicos empregues pelos autores do catálogo para justificar as suas escolhas levantam uma questão: existe realmente em Ticino uma produção arquitetónica que mereça tal esforço?” [13]

Apesar de uma intransigente posição, Dal Co irá destacar Flora Ruchat-Roncati, quando refere, “ela interpreta conscienciosamente Le Corbusier – na casa de Morbio, na escola de Riva San Vitale (realizada em colaboração com Aurelio Galfetti e Ivo Trümpy) ou no centro de lazer de Bellinzona.” [14]  Esta observação não deixa de ser compreendida com outros contornos quando menciona, no início da sua crítica, que nesta área geográfica de Ticino “as influências externas permanecem à margem, e a produção arquitetónica raramente dá aos seus autores a possibilidade de desenvolver e verificar concretamente as suas pesquisas.” [15]  Para se apreender a critica de Dal Co, é necessário contextualizá-la no seu tempo e momento da arquitetura, que vivia uma importante transição de critica ao movimento moderno.

A divulgação da obra, após o aludido catálogo, acontecerá através das revistas Lotus Internacional, em 1977, no primeiro volume da revista Ianus, em 1980 e na Quaderns d’Arquitectura i Urbanismo, em 1982. Nesta última publicação, intitulada Del Conocimiento a la invención, Martin Dominguez [16] menciona que, de todas as obras divulgadas na exposição Tendenzen, a que mais marcou uma geração de arquitetos terá sido o projeto das Piscinas de Bellinzona. Com saudade e nostalgia refere mesmo que a mesma “ficou gravada na nossa memória representando de certa maneira, toda a obra dos arquitetos de Ticino.” [17] O artigo, dirigido apenas a Aurelio Galfetti com o intuito de conhecer com mais profundidade a sua obra, é acompanhado por uma relevante entrevista ao mesmo, onde este refere, quando abordado o projeto da Piscinas, que este foi concebido

“como intervenção unitária na paisagem e não como uma série de elementos diversos do programa agrupados numa forma mais ou menos correspondente aos pré-requisitos funcionais. Le Corbusier falava do aqueduto romano como elemento que ao superar a escala das casas vizinhas, não destrói, mas acentua as qualidades do lugar. Tomámos então esta ideia de utilizar o programa como pretexto para propor uma intervenção que não procurava integrar-se com o sítio, mas que tentava dar a este uma identidade mais forte. Aliás pensávamos que a passadiço que reúne e organiza todos os elementos do programa era um elemento público, de passeio, pertencendo ao sistema de muralhas que definem o perímetro de Bellinzona, desde a idade média. Construímos se quiseres, um fragmento de muralha.” [18]

É curioso realçar-se, em continuidade com as palavras de Galfetti, para a Quaderns, o que Stanislaus Von Moos [19], em 2001, transmite no seu texto Castello Propositivo, Identidade, Memória e Monumentalidade em Ticino 1970-2000,

“Rossi enfatiza que a reconstrução da muralha deveria servir, entre outras coisas, para criar uma ligação com a recém-concluída piscina pública projetada por Galfetti, Ruchat e Trümpy, cujo projeto foi provavelmente concebido tendo em mente Le Corbusier (Plan Obus para Argel, 1931) em vez de Rossi. Poderá esta ser uma das poucas interseções onde as ideias de Rossi e Le Corbusier convergem?” [20]

Seguiram-se, nas décadas posteriores, várias publicações sobre a obra de Aurelio Galfetti, como é exemplo a publicação da Editoral Gustavo Gili, com introdução de Mário Botta, e produção de Mirko Zardini, em 1992, onde o projeto das Piscinas guarda sempre respeitantes menções. A obra continua a ser difundida através de várias exposições coletivas como é o caso da exposição Cuatro Arquitectos Suiços realizada em 1996, no Museu Nacional de Bellas Artes, em Buenos Aires, onde Galfetti se encontrava inserido, juntamente com Mario Botta, Luigi Snozzi e Livio Vacchini. Podemos referir que foram proferidas várias conferências, por Galfetti, em território suíço ou fora dele, nos anos consequentes, demonstrando que a obra continuou o seu percurso através das suas palavras.

Em 2006, a Embaixada Suíça em Portugal realiza, em colaboração com a Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto e o Departamento de Arquitetura da Universidade de Coimbra, uma exposição intitulada “Arquitectura Ticiense no Mundo: Referências e Protagonistas”, tendo-se realizado no Porto e em Coimbra. A obra das Piscinas encontrava-se incluída na lista, sendo de referir que Galfetti é convidado a efetuar uma conferência, a qual intitulou Tra terra e cielo: permanenza dell’arquitettura, seguida de um debate com o arquiteto Gonçalo Byrne.

Mais tarde, em 2009, foi publicado um pequeno livro intitulado Il Progetto dello Spazo [21], título de uma conferência de Aurelio Galfetti, realizada em 2007, na USI de Mendrísio (Università della Svizzera italiana). Quando apresenta o projeto das Piscinas, Galfetti refere “interessava-nos o “espaço-tempo”, mais concretamente o espaço da caminhada, o espaço do movimento” [22]. Pode-se acrescentar que passados 54 anos, transformaram também em espaço-cultura.

Sobre Flora Ruchat-Roncati, nas décadas posteriores, as publicações são em menor quantidade, comparativamente com outros colegas da mesma geração, apesar da mesma prosseguir intensamente na profissão, no ensino e na investigação. Nesse sentido é relevante referir-se à publicação da Gta Verlag, sobre a sua obra, em 1998, onde as Piscinas são evidentemente mencionadas. Apesar de constituir uma importante publicação, a mesma teve pouca propagação fora do meio académico, meio onde Flora ganha destaque, sendo a primeira mulher a se tornar professora titular, com plenos direitos e responsabilidades académicas, na ETH de Zurique, em 1984. Recentemente a sua importância tem sido alargada, através de novas investigações e publicações, na sua universidade.

Em 2009 realiza-se em Mendrisio uma exposição e consequente seminário, intitulada Il Bagno di Bellinzona: l’opera e la sua salvaguardia, organizada por Nicola Navone [23], com Franz Graf [24] e Bruno Reichlin. No seminário, é concretizada uma mesa-redonda, que junta os três autores do projeto, com Franz Graf, Martin Steinmann, representantes do Município de Bellinzona e do Departamento do Território do Cantão de Ticino, para discutir o futuro deste equipamento, que apresentava à data, sinais marcantes de desgaste, deparando-se igualmente com uma preocupação recorrente, associada ao uso predominante do betão, nos edifícios desta década. É construída uma maquete do projeto, para apoiar a leitura da obra, encontrando-se atualmente guardada no Archivio del Moderno. A maquete procura a abstração, numa depurada e intencional síntese.

Figura 3 – Fotografia da maquete existente no Archivio del Moderno (Fonte: Fotografia da autora, 2024)

 

Como consequência da exposição e catálogo, realizado em Mendrisio, será editado em 2010, uma monografia, da responsabilidade de Nicola Navone e Bruno Reichlin, intitulado Il Bagno di Bellinzona di Aurelio Galfetti, Flora Ruchat-Roncati, Ivo Trümpy, com textos de análise, a que se irá fazer referência, de Martin Steinmann, Bruno Reichelin, Nicola Navone, Franz Graf, entre outros. O livro encontra-se desde 2021 na terceira edição, apesar de estar apenas publicado em italiano. São significativos os inúmeros desenhos das várias fases de projeto, desde o concurso até à sua construção, apoiados em detalhes de execução, provenientes dos arquivos dos arquitectos, doados ao Archivio del Moderno. As fotografias, a convocar vários tempos, são demostrativas da manifesta alteração da paisagem, sem que o percurso deixe de assumir um papel predominante no seu território.

Apesar da dimensão e abundância arbórea, visualiza-se, nas fotografias publicadas, com data de 2009, a obra a pedir manutenção, desde a madeira do pavimento desgastada e já em parte modificada, às deterioradas divisórias. A obra envelhece, permanecendo viva no seu gesto, mas a carecer, à data, de cuidados de salvaguarda.

Em 2013, após a morte de Flora Ruchat-Roncati, é publicado um livro intitulado Flora Ruchat-Roncati, le opere, la ricerca, l’insegnamento. O livro, de autoria de Serena Maffioletti, Nicola Navone e Carlo Toson, surpreende quem, até à data, pouco ou nada conhece sobre Flora, sendo através das suas obras, desenhos e textos, demonstrativo do seu percurso na arquitetura.

O livro recentemente publicado, de Irina Davidovici, intitulado The Autonomy of Theory, Ticino Architecture and its critical reception, estabelece uma crítica contundente sobre a propagação da arquitectura de Ticino, tentando compreender “o papel do discurso arquitetónico gerado por mecanismos implacáveis, muitas vezes opacos, de avaliação crítica” [26].

Apesar das várias exposições, inúmeras publicações em excertos de livros dos arquitectos autores, publicações nas revistas da especialidade ou artigos académicos, verifica-se que as mesmas são sobretudo provenientes dos vários cantões suíços, como se a própria topografia fosse ela mesma impeditiva da sua propagação. No entanto, é importante ressalvar que tanto a Università LUAV di Venezia assim como o Politecnico di Milano produzem importantes trabalhos de investigação sobre a obra. Também ausente das fundamentais seleções críticas, como as de Kenneth Frampton [27] ou de William J. R. Curtis [28], a sua dimensão territorial vai perdendo força, quando apenas percecionada numa bidimensionalidade gráfica de gesto apelativo.

Embora a obra seja uma importante referência arquitetónica para uma geração de arquitetos, formados nas escolas suíças de arquitetura, nomeadamente a ETH de Zurique, EPFL em Lausanne e especialmente a USI de Mendrisio, pela proximidade à obra e importância do papel desempenhado por Galfetti, professor e primeiro diretor desta última, não deixa de ser significativo realçar que, fora deste contexto geográfico e fora das áreas de proximidade do norte de Itália, a obra acaba por deixar, com o tempo, poucas memórias a quem não a visita. E por vezes, para contrariar, é reavivada com novas análises e interpretações, numa espécie de eterno retorno.

A demonstrar que a obra continua viva e a percorrer distintos campos de divulgação, numa recente exposição de desenhos, com curadoria de Manuel Montenegro, Helen Thomas e Marco Bakker, intitulada Begin Again. Fail Better, alguns desenhos de Flora Ruchat-Roncati foram selecionados, tendo sido expostos no Kunstmuseum, em Olten. Dois dos desenhos, já apresentados no livro Un Dialogo Ininterrotto, Studi su Flora Ruchat-Roncati [29], apresentam esboços para a proposta de concurso das Piscinas, onde se experimentam e questionam ligações ao lugar, marcado por muralhas que se evidenciam como linhas territoriais, impregnadas de grande influência no gesto da proposta.

Figura 4Esquiços de Flora Ruchat-Roncati, para as Piscinas de Bellinzona, 1967 (Fonte: Dagli Esordi Al Bagno Di Bellinzona, artigo de Nicola Navone, publicado em Un Dialogo Ininterrotto, Il Poligrafo, 2018).

 

 

2. 1964-1966

Ao ser analisado o intervalo temporal entre 1964 e 1966, anos que antecederam o lançamento do concurso para as Piscinas, pode-se referir constituírem anos de factos marcantes e intensa produção critica disciplinar. Os temas da mobilidade nas cidades começam a contagiar o desenho urbano e novos paradigmas socais invertem o discurso, gerando novos códigos arquitetónicos, alicerçados na cidade, no território e na paisagem.

Anos antes, Alison e Peter Smithson, precursores das interpretações das cidades através dos seus esquemas de mobilidade, ensaiam diagramas de ligações pedonais, designadas como streets-in-the-air [30], a conectar habitações de alta densidade, permitindo criar padrões de movimento, desnivelando o circuito viário com o pedonal, convocando conforto urbano e permitindo simultaneamente a desocupação do solo.

A proposta de Alison e Peter Smithson para o concurso de Golden Lane [31], em 1952, identifica as streets-in-the-air como espaços e não como corredores ou varandas. Esta preposição de ruas a convocar vida, onde tudo acontece fora da intensidade viária, bastante significativa nas cidades europeias industrializadas, marcará certamente toda uma nova geração de arquitetos, cujas proposições socias e éticas fundiam o entendimento e significado da arquitetura.

Voltando ao espaço temporal inicialmente mencionado, a 13ªTrienal de Milão, de 1964, comissariada por Umberto Eco e Vittorio Gregotti, define Tempo Livre como tema, constituindo a primeira vez que é lançada, como propósito curatorial, uma reflexão sobre definições quantitativas e qualitativas do tempo livre, o papel do consumo, assim como a relação com o tempo de trabalho.

Umberto Eco esclarece, no prefácio, de 1982, para a reedição do livro de Vittorio Gregotti, o Território da Arquitectura

“A Trienal deveria abordar (e não apenas através da exposição de objetos e projetos infraestruturais) o tema do “lazer”. Esse era também um tema utópico, típico do boom do pós-guerra: a conquista do tempo livre como libertação (ou pausa) da alienação do trabalho. Na Trienal de 1964, decidimos que o público deveria aceder às exposições propriamente ditas através de – como dizer? – um percurso labiríntico, uma série de passagens audiovisuais, onde a arquitetura, as artes aplicadas, a pintura, a escultura, o cinema e a televisão se unissem num discurso crítico sobre a ideia de lazer. Utilizávamos o espaço arquitetónico como um conceito global para discutir e questionar as utopias da arquitetura como projeto universal.” [32]

O Tempo Livre, tema complexo com implicações filosóficas e utópicas, permitia a possibilidade de repensar a própria maneira de apresentar a arquitetura, passando a ganhar conotações sociológicas mais do que apenas preposições formais. À arquitetura, ao design e à arte era pedido que apresentassem o momento de mudança, representando o mundo contemporâneo, e que numa atitude critica, refletisse sobre o sentido do termo lazer.

Nicola Navone esclarece [33] que as ideias de Vittorio Gregotti tinham uma importante ressonância no debate arquitetónico de Ticino, apontando a relação de amizade e admiração que o mesmo tinha por Peppo Brivio [34], importante arquiteto e intelectual de Ticino, tendo desenvolvido com ele o inesquecível espaço expositivo, denominado Caleidoscópio, juntamente com Umberto Eco, Ludovico Meneghetti e Giotto Stoppino, na referida 13ª Trienal de Milão de 1964. O aludido espaço, de planos inclinados de espelhos, constitui um extenso percurso refletivo, de espaço/tempo.

Figura 5 – Caleidoscópio, Secção Introdutiva de caráter Internacional, XIII Trienal de Milão, 1964 (Fonte: Archivio Fotografico Triennale Milano, ©Ancillotti)

 

 

A convocar a ideia de mobilidade, Aldo Rossi e Luca Meda, desenham, para a referida Trienal, um acesso infraestrutural sobrelevado em estrutura de ferro, para aceder ao Palazzo dell arte, em Milão, atribuindo à sua fachada uma nova função, transformando-a no suporte de uma ponte, de pilares quadrangulares e cilíndricos a suportar uma estrutura de configuração triangular, na sua secção transversal. Estes elementos tipo, colocados como uma conjugação de artefactos urbanos, apontam novos paradigmas, constituídos por novos elementos de cidade, estabelecendo leituras distintas de elementos fixos, de memória coletiva.

Figura 6 – Aldo Rossi e Luca Meda, Entrada Palazzo dell’arte, XIII Trienal de Milão, 1964, (Fonte: Archivio Fotografico Triennale Milano, © Luca Meda).

 

 

No ano seguinte, Le Corbusier irá apresentar a proposta para o Hospital de Veneza, contribuindo para perpetuar o fascínio numa importante geração de novos arquitectos, atraídos pelo seu Mestre, que absorviam avidamente toda a sua produção construída ou publicada. A proposta para este equipamento desenha tecido urbano, numa continuidade radical, apontando novos pressupostos territoriais. Já não é o gesto que impõe um desenho no lugar, mas o tecido urbano existente a definir o seu percurso. Ruas, ligações e praças, sobrelevadas em relação ao plano da água, permitem a sua visualização, definindo estratégias para a implementação de um denso equipamento para a cidade de Veneza. A história da cidade não é eliminada, mas traduzida, utilizando um desenho modular, de múltiplas repetições, substituindo, na sua implementação, a fundação de madeira veneziana por pilares de betão. Muito se pode contra-argumentar sobre a disposição programática, face à iluminação natural e à relação do utilizador com o espaço, no entanto é importante realçar o caracter inovador, na definição de um mat-building [35], para um edifício hospitalar. A construção modelar, aliada à preocupação tectónica ganha importância no campo disciplinar, ajuntando a sua introdução a novos programas urbanos, conjugados com códigos pré-existentes.

Tudo se prepara para a construção deste equipamento, de gesto e escala territorial, onde a repetição do módulo se destaca a fazer cidade, superando a escala da mesma, no entanto a morte prematura de Le Corbusier, no mesmo ano de 1965, irá suspender a sua concretização.

Às novas leituras dos termos território, cidade e arquitetura, apontar-se-ia como obras de referência bibliográfica, a marcar o discurso arquitetónico e o seu significado, neste espaço temporal, três importantes publicações, realizadas em 1966: a pertinente análise critica, Il territorio dell’architettura, livro da autoria de Vittorio Gregotti, L’architettura della città, de Aldo Rossi, outra referência igualmente pertinente para a procura de novos léxicos, na definição de factos urbanos e teoria sobre a cidade, analisada como uma arquitetura e Complexity and Contradition in Architecture, de Robert Venturi.

Enquanto Rossi irá valorizar, no projeto da cidade, a densidade de layers e o valor do locus, Venturi irá convocar as questões da comunicação, da imagem e do significado da arquitetura. Gregotti, recorrendo aos temas do território, da paisagem, da antropogeografia e da história, para tratar os usos e os significados da arquitetura, irá possivelmente singularizar-se, por refletir sobre a noção de habitabilidade através dos materiais que compõem a arquitetura.

 

3. Arquitetos

Aurelio Galfetti (1936 – 2021), Flora Ruchat-Roncati (1937 – 2012) e Ivo Trümpy (1937), antes de submeterem a proposta do concurso para as Piscinas de Bellinzona e apesar de bastantes novos, tinham já construído alguns edifícios escolares e moradias particulares de alguma complexidade urbana e programática. Essa experiência acumulada, dos vários anos em que trabalharam juntos em Bedano (1962-1970), terá sido certamente crucial para os capacitar a desenvolver o projeto das Piscinas, numa contínua procura de eficientes soluções construtivas, mas também éticas. [36]

Para uma nota introdutória breve de cada arquiteto pode-se mencionar que Aurelio Galfetti, nascido em Lugano, forma-se em 1960, na ETH de Zurique. Após a importante parceria com Flora Ruchat-Roncati e Ivo Trümpy, irá, entre 1970 e 1978, continuar a trabalhar através de outras não menos impactantes parcerias com vários arquitetos de Ticino, como Livio Vacchini, Luigi Snozzi, Rino Tami [37] e Mario Botta.

Em 1984 será professor convidado na EPF Lausanne e em 1987 na UP8 em Paris-Bellevile. Com Mario Botta, em 1996, funda a Academia de Mendrisio, da Universidade da Suíça Italiana, sendo seu diretor entre 1996 e 2001 e professor na mesma instituição até 2010. Até aos dias de hoje, alunos e professores guardam profundas saudades, continuando a ser uma das figuras principais da história da Academia, sendo apontada por muitos a sua grande humanidade. Nicola Navone acrescenta a sua enorme generosidade, aliada à sua capacidade de olhar a realidade sem nostalgia, nem arrependimento, sem revogar o seu valor deontológico, do respeito pela disciplina. [38]

Das obras concretizadas, destacamos a sua intervenção no Castelgrande, em Bellinzona, um dos três castelos que cercam a cidade. Património da Unesco, desde 2000, foi originalmente construído no Séc. XIII, tendo sido ampliado e recuperado em vários momentos da sua história, sendo a última intervenção da autoria de Aurelio Galfetti, aliando os temas da preservação e transformação, como elementos equitativos, na intervenção no património.

Num período bastante dilatado (1981-1993) a intervenção no Castelgrande potenciou a criação de espaço público acessível, nos vários taludes das muralhas, com planos verdes a relacionarem-se com a marcante paisagem envolvente, estabelecendo uma clareza construtiva e formal no redesenho e na supressão de construções dispersas e vegetação justaposta à muralha. Esta transformação, de revelar demolindo o dissonante, segundo Galfetti introduz uma nova leitura do património, revelando uma perspetiva mais claramente percetível do lugar, através da seleção e subtração. A apoiar e justificar esta intenção, Galfetti desenha uma imponente abertura escavada na rocha, permitindo que a mesma possa ser interpretada, para incorporar nela um elevador e escada em betão, a ligar um expressivo desnível, concebendo um mecanismo de interligação da cidade ao castelo. Na criação deste espaço público, aliada à intervenção de Livio Vacchini, no desenho da nova praça, intitulada Piazza del Sole, a cidade, a colina e o seu castelo transpõem um forte vínculo arquitetónico e social com a cidade.

Este gesto, de exibir o interior da montanha, na sua componente geológica, revelando as várias camadas de sedimentação e de erosão glaciar, poderá estabelecer um paralelismo com o gesto infraestrutural das Piscinas. Podemos intuir que a revelação das camadas de rocha, através dos acessos em betão, a ligar cerca de 50 metros de desnível ou o percurso em betão com mais de 300 metros de comprimento das Piscinas, constituem ambos incentivos à mobilidade, elementos da paisagem, de cariz territorial, criadores de espaço-tempo.

Figura 7 – Castelgrande em Bellinzona (Fonte: Fotografia da autora, 2024).

Figura 8 – Castelgrande de Bellinzona, Corte do elevador público (Fonte: Archivio del Moderno).

Figura 9 – Castelgrande de Bellinzona, acesso ao elevador público (Fonte: Fotografia da autora, 2024).

Figura 10 – Castelgrande de Bellinzona, acesso ao elevador público (Fonte: Fotografia da autora, 2024).

 

Flora Ruchat-Roncati, nascida em Mendrisio, forma-se na ETH de Zurique, em 1961. Continuará também o seu percurso na arquitetura através de várias parcerias, onde se destacam Doef Schnebli, Tobias Ammann e Renato Salvi. Tendo-se consolidado como elemento proeminente da arquitetura de Ticino, Flora será também a primeira mulher a se tornar professora titular, na ETH Zurique, entre 1985 e 2002, contribuindo para a formação de várias gerações de arquitetos. Na sua passagem por Roma, onde viveu e abriu atelier, tornou-se arquiteta consultora do Consórcio nacional de Cooperativas de Habitação.

O seu percurso académico irá também passar, como docente, por outras universidades, sendo de destacar a Università LUAV di Venezia assim como o Politécnico di Milano. Ao seu trabalho como arquiteta e professora, acrescenta-se a de teórica e urbanista, acrescentando ainda a sua dimensão política.

Após a dissolução do estúdio de Bedano, Flora e Ivo mudam-se para Riva San Vitale, para uma casa-pátio, recuperada por Flora, denominada Corte dell’Inglese. Esta construção medieval será habitação e estúdio de vários artistas e arquitetos. Flora desejou e conseguiu aqui criar um importante espaço de comunidade, onde Ivo Trümpy irá trabalhar até aos dias de hoje.

Figura 11 – Loggia do Corte dell’Inglese, em Riva San Vitale (Fonte: Fotografia da autora, 2024).

 

 

Ivo Trümpy, nascido em Bellinzona, forma-se na Escola Técnica Superior de Lugano-Trevano. Depois da parceria com Galfetti e Flora, forma uma nova parceria, com Aurelio Bianchini, constituindo novo estúdio em Riva San Vitale. Lecionou na SUPSI (Scuola universitaria professionale della Svizzera italiana). O seu contributo para o projeto das Piscinas, segundo Nicola Navone [39], é certamente crucial na fase do projeto de execução e obra. Ivo Trümpy informa, depois de uma visita ao seu estúdio, que o acompanhamento da obra era intenso e muitas vezes diário, exigindo um continuado trabalho de desenho, de pormenorização, para que conseguissem responder à rapidez da obra, resolvendo todos os detalhes possíveis.

Sobre os anos em que trabalharam juntos, em Bedano, os três referem, com saudade, em várias publicações, terem sido de grande cumplicidade e dedicação à profissão, fortemente influenciados por Le Corbusier. Aurelio Galfetti, alucida os três viviam “uma colaboração nascida de uma grande paixão pela arquitetura e da admiração de um grande mestre, Le Corbusier, o nosso único mestre”. [40]

Relativamente às obras construídas, a escola de Riva San Vitale, pequeno município de Ticino, ocupa uma posição de relevância, por se tratar de um equipamento escolar, projetado e construído em duas fases (1962 e 1974), onde se comprova a referida veneração por Le Corbusier mas também a preocupação que os arquitetos tinham em resolver cidade, ao desenhar um equipamento para uma pequena vila localizada na margem do lago de Melano. A obra encontra-se, tal como as Piscinas, inscrita no inventário dos bens culturais protegidos a nível cantonal.

Tal como Martin Steinmann alude, no seu artigo La Scuola ticinese all’uscita da scuola, publicado na referida monografia [41], a escola espelha o papel social assumido pela arquitetura, traduzindo também um certo compromisso político. Refere também que é possível estabelecer, nesta obra, inúmeros paralelismos entre os pressupostos do projeto com códigos urbanos, como ruas, atravessamentos, ligações visuais, mencionando que a experiência da cidade convoca a produção do sentido dos espaços. [42]

Figura 12 – Escola Primária Riva San Vitale, vista geral exterior (Fonte: Fotografia da autora, 2024).

Figura 13 – Escola Primária Riva San Vitale, vista atravessamentos longitudinais (Fonte: Fotografia da autora, 2024).

 

 

Encontrando-se atualmente bem recuperada, com uma intensa utilização, a escola espelha influencias corbusianas, elucidadas por Aurelio Galfetti, como as propostas para a habitação coletiva do Oued Ouchaia em Argel e as varandas do bairro Frugès em Pessac [43]. Galfetti reforça que “Le Corbusier era, evidentemente, o centro dos nossos interesses, embora nas nossas discussões não faltassem referências a outros arquitetos” [44]. Acrescenta que folheavam avidamente a revista Werk e a revista francesa L’Architecture d’Aujourd’hui, mais do que revistas italianas. A acrescentar, cada um levava livros, novidades, que seriam posteriormente acompanhados de longas discussões, enquanto o desenho fluía, e muitas vezes continuamente se redesenhava. [45]

A escola, para quem hoje a visita, transpõe novidade na forma como a sua implantação cose o tecido urbano da pequena vila, numa liberdade elucidativa, sem evidenciar a sua construção a vários tempos. Ausentes de barreiras, os vários volumes do equipamento dissolvem-se com o lugar, proporcionando intensa circulação e uma constante relação com o seu território. As escadas, passagens e varandas, por onde as crianças circulam, projetam a vila e a sua topografia, como se essa relação visual fosse tão importante como a própria mobilidade. Sobre as salas de aula, Ivo Trümpy menciona “são bastante generosas, maiores do que era habitual na época, com janelas em todos os quatro lados para garantir boa iluminação e ventilação natural. A vista é livre para a aldeia a norte, para o campo a sul, para os picos das montanhas a nascente e a poente.” [46] E depois há o betão à vista, as paredes de tijolo maciço rebocadas e pintadas de azul corbusiano, de amarelo ocre, característico na região de Ticino, a fundirem-se com as montanhas.

Figura 14 – Escola Primária Riva San Vitale, vista geral exterior (Fonte: Fotografia da autora, 2024).

 

 

4. Concurso | Projeto | Obra

4.1 Concurso

A cidade de Bellinzona, capital do cantão de Ticino, à data do concurso, atravessa um acelerado crescimento urbano. Caracteriza-se historicamente como um lugar de fronteira, delimitado pelo rio Ticino, no encontro de três majestosos vales, Leventina, Blenio e Mesolcina. Ao seu carácter fronteiriço, definido pela sua localização geográfica, impõem-se três castelos medievais, sobre a planície de Magadino: Sasso Corbaro, Montebello e o já mencionado Castelgrande, classificados como Património da Unesco, desde 2000.

O concurso para as Piscinas, lançado pelo município de Bellinzona, a 31 de março de 1967, convoca a desenhar um novo complexo público, numa área pertencente ao município para a sua expansão. A área de intervenção, com aproximadamente 27 mil m2, próximo de equipamentos desportivos e escolares, já presentes ou previstos, incorpora uma pista de patinagem pré-existente, considerada no programa de concurso a ser adaptada. A área de expansão prevista para o crescimento de outros equipamentos futuros, adjacente ao limite do concurso, permite deixar em aberto, reflexões futuras sobre perspetivas para o crescimento do tecido urbano de Bellinzona.

Figura 15 – Fotografia aérea antes da construção das Piscinas, com marcação do limite de intervenção, Bellinzona (Fonte: Monografia Il Bagno di Bellinzona di Aurelio Galfetti, Flora Ruchat-Roncati, Ivo Trümpy, marcação do limite efetuado pela autora).

 

 

O programa inclui o desenho de três piscinas: uma piscina olímpica, com outra mais pequena, próxima, mas separada, com duas pranchas de saltos e duas plataformas, uma piscina com água aquecida para ensino, com 25×21 metros e uma piscina infantil associada às áreas de recreação. A pista de patinagem, referida a ser adaptada, deve ser convertida em piscina para não nadadores, no verão. Devem ser também considerados vestiários, bilheteiras, áreas técnicas e de serviço, necessárias para uma capacidade diária de 3000 pessoas, onde se deve incluir um restaurante self-service, para aproximadamente 300 pessoas. Podem inscrever-se a concurso arquitectos inscritos na Ordem Ticinense de Engenheiros e Arquitectos, domiciliados no cantão ou próximo da região.

A área de intervenção define-se a noroeste, pelo aterro, construído no início do século XX, resultante da grande obra de drenagem, para proteção de inundações, denominada Plano Magadino. A sua construção permitiu a criação de uma ampla planície, a 2,5 metros acima da cota da água, cuja imagem remete para uma extensa e natural várzea, garantindo espaço de usufruto da cidade. Neste limite noroeste, marcado pelo aterro, está prevista a construção de uma via rápida, a qual as propostas de concurso devem ter em consideração. O mesmo acontece no limite sudeste, onde se prevê a continuação do acesso viário existente, estando deste modo planeada a extensão da via Mirasole. O programa de concurso define que a entrada para as Piscinas deve estar colocada neste previsto acesso viário.

Figura 16 – Vista do Plano Magadino, Bellinzona (Fonte: Storia – Consorzio Correzione Fiume Ticino (ccfticino.ch)).

 

 

Adjacente ao limite sudeste da área de concurso existe um importante equipamento escolar, denominado Ginásio Cantonal, construído entre 1956 e 1958, dos arquitetos Alberto Camenzind [47] e Bruno Brocchi [48]. Influenciada, na materialidade e volumetria, por equipamentos escolares do norte da europa, a escola articula-se em torno de uma sequência de pequenos pátios-jardim, encontrando-se atualmente recuperada.

Todo o processo do concurso, desde os arquitetos convidados a apresentar proposta, aos inscritos e à análise das várias propostas submetidas, encontra-se muito bem detalhado na fundamental monografia Il Bagno di Bellinzona di Aurelio Galfetti, Flora Ruchar-Roncati e Ivo Trümpy, de Nicola Navone e Bruno Reichlin.  Para além dos vencedores do concurso, podemos destacar os concorrentes que ficaram em segundo, terceiro, quarto e quinto lugar: Francesco van Kuyk, Dolf Schnebli, Peppo Brivio e Mario Campi.

Quanto ao júri, enumeramos todos os intervenientes, dada a sua relevância na asserção da proposta vencedora: o presidente do sindicato de Bellinzona, Sergio Mordasini, o presidente da empresa Bagno Pubblico SA, Fermo Patocchi e os arquitectos Tita Carloni e Luigi Snozzi (membros da Comissão Cantonal de Monumentos Históricos e desde 1962 envolvidos na elaboração do Plano de Salvaguarda do Centro Histórico de Bellinzona), à data do concurso, com 36 e 35 anos respetivamente. A estes arquitetos junta-se Sergio Pagnamenta, mais velho e com bastante prática profissional.  Na equipa responsável pela elaboração do referido Plano de Salvaguarda, encontra-se também incluído o arquiteto Livio Vacchini, apesar deste não ter sido júri do concurso das Piscinas.

A entrega da proposta do concurso realiza-se a 31 de agosto de 1967, com entrega de maquete à escala 1:500, no dia seguinte. Considera-se importante realçar o tempo definido para a elaboração deste importante equipamento para a região: cinco meses. Este tempo é longo, se comparado com a realidade atual dos concursos públicos, circunstância muitas vezes referida por Galfetti como essencial para um desenvolvimento sério e aprofundado do programa e da sua inserção no lugar.

Nicola Navone esclarece-nos na referida monografia, que Carloni, Snozzi e Vachinni desenvolvem no Plano de Salvaguarda um levantamento aprofundado do centro histórico, para propor uma estratégia de ligação entre os monumentos e o tecido da cidade. Paralelamente a este tema, concebem “uma rede de conexões pedonais públicas, ao longo do traçado das próprias muralhas, às vezes nos caminhos, às vezes ao pé do muro, garantindo um percurso único” [49]. Esta intervenção capacita a proposta de “possibilidade de visita, além dos castelos, das torres espalhadas ao longo da muralha defensiva”. [50]

É neste contexto, de programa desportivo essencial para a cidade, num lugar histórico, a refletir sobre a sua salvaguarda, e a viver simultaneamente uma franca expansão urbana, aliado a um júri preparado e esclarecido, que se enquadra a escolha da proposta vencedora. Enquanto todas as outras propostas se concentram nos limites Nordeste e Noroeste, de forma mais orgânica ou mais racionalista, condicionadas pelos acessos, unindo o tecido existente, conjugando premissas futuras programáticas, a proposta vencedora, de Aurelio Galfetti, Flora Ruchar-Roncati e Ivo Trümpy, transpõe uma resposta apenas correta, para manifestar a urgência de pensar sobre como atuar na cidade e como refletir sobre o território.

Para a equipa vencedora, este particular lugar, de topografia vigorosa, identitária de uma região marcada por construções infraestruturais capazes de lidar com altitudes extremas e vales profundos, transforma-se na força reveladora da proposta que, ao extravasar o limite de intervenção, apreende que a escala deverá ser territorial.

Os arquitetos destacam-se ao propor um passadiço, colocada no centro da área de intervenção, ortogonal ao rio Ticino, com dois braços perpendiculares ao referido atravessamento, elevado seis metros acima da cota da planície. Apresentam a proposta com duas soluções de atuação, uma dentro do limite de intervenção e outra a extravasar o mesmo, na expetativa de elucidar que a força da solução se encontra no prolongamento do seu gesto, numa conquista de ligação urbana. O passadiço, ao sobrelevar-se permite libertar o plano térreo para a colocação das várias piscinas, articuladas numa liberdade formal. A três metros de altura, sob a passadeira, colocam o programa, fundindo forma e função.

Figura 17 – Hipsometria Parcial, Bellinzona, Cantão de Ticino (Fonte: www.mapbox.com).

Figura 18 – Painel da proposta de Concurso, Planta Geral, agosto 1967 (Fonte: Archivio del Moderno, AFR T 19/2).

 

 

Os painéis da proposta vencedora revelaram engenho, coragem e acutilância urbana, ao delinear uma solução que, para se definir completa, tem de suplantar os limites estabelecidos pelo programa do concurso. O projeto convoca, a várias escalas, nos vários registos gráficos, rigorosos ou desenhos perspéticos livres, a procura de identidade do lugar, aliando-se à incessante ideia de convocar mobilidade. Procura libertar a planície artificial, como se não questionasse um direito já alcançado, que dificilmente imagina ficar condicionado, depois de uma obra de engenharia tão soberana.

A proposta aponta, nos esquiços, a ideia de convocar ligação visual com a topografia, os seus castelos e as suas muralhas. A contrastar a formalidade dos requisitos legais das piscinas, desenha uma sugestiva interpretação dos banhos de rio, ao pontuar, sob um dos braços da passadeira, uma orgânica forma para a piscina das crianças, a criar uma subtil concavidade na planície. A arborização proposta ainda é formal e estaticamente plantada, a demarcar vias de acesso ou a criar bosques densos muito localizados. No entanto, nos cortes longitudinais é fundamental verificar-se a densidade e porte desejado desta arborização que levará tempo a tornar-se consistente na paisagem e no seu território.

Figura 19 – Painel da proposta de Concurso, Alçados, agosto 1967 (Fonte: Archivio del Moderno, AFR T 19/3).

Figura 20 – Painel da proposta de Concurso, Esquemas do Passadiço, agosto 1967 (Fonte: Archivio del Moderno, AFR T 19/3).

 

 

É fundamental destacar a coragem e discernimento do júri, que ao entender a pertinência da solução, escolhe uma solução mais dispendiosa, que carece de consulta pública para capacitar o uso de terreno, identificado como sendo de expansão futura, não destinado a esta primeira fase de investimento municipal. Destaca-se a escolha do júri por uma proposta que resolve futuros impasses, ao permitir que grandes fluxos sejam feitos em lugares distintos, convocando organicidade de movimentos urbanos. Segundo Nicola Navone, no relatório do júri poderá ler-se “cada ponto de partida levará ao destino correto”, acrescentando que o júri reconhece a validade da proposta como “contribuição fundamental para o pensamento arquitetónico atual”, “fragmento de organização urbana, composto por circulação, estruturas e mobiliário especializado (equipamento balnear) acima do espaço natural integralmente respeitado”, “instalação autenticamente nova e de seguro interesse”. [51]

Bruno Reichelin faz menção, no seu artigo na monografia, às referências destacadas pelos arquitetos na apresentação da proposta, como a Pont du Gard, mas também as imagens mais familiares da ponte de Lavertezzo, no vale Verzasca, destino dos banhos de rio, nas férias de verão dos arquitetos, na sua adolescência, referindo “uma imagem forte que resume perfeitamente o conceito das Piscinas: um percurso público ancorado no território, solidamente construído para perdurar no tempo e oferecer uma tribuna de onde se pode contemplar a magnífica paisagem, próxima e distante.” [52] O mesmo conclui que o projeto se encontra “na confluência de algumas das linhas mais interessantes do pensamento arquitetónico do pós-guerra e as expressa com louvável clareza. Raramente a cultura territorial, o pensamento urbanístico e arquitetónico, encarnaram, no segundo pós-guerra, num projeto construído: não esqueçamos, de facto, que as propostas urbanísticas mais interessantes e radicais dos arquitetos do Team X permaneceram no papel. Obra insubstituível, única no seu género, as Piscinas de Bellinzona merecem sem dúvida um lugar de destaque no património arquitetónico mundial do século XX.” [53]

Onde todos quase não veem mais do que as propostas territoriais de Le Corbusier para Argel [54] ou Rio de Janeiro [55], os gestos infraestruturais de Chandigarth [56], ou as já mencionadas streets-in-the-air, the Alison e Peter Smithson, ao serem apoiadas estas comparações, acrescenta-se que as mesmas não a reduzem, mas porventura a sedimentam, ajustando a sua construção à escala do lugar, convocando as suas reminiscências e busca de significado cultural, na paisagem.

Num impulso infraestrutural, a proposta expressa os pressupostos de um equipamento público, resolvendo, num gesto dual de continuidade e radicalidade, a ligação territorial entre o vale, Bellinzona e o rio Ticino.

Figura 21 – Fotografia da maquete da Proposta de Concurso, 1967 (Fonte: Archivio del Moderno, AFGdP).

Figura 22 – Fotografia da maquete da Proposta de Concurso com esquemas para expansão do Passadiço, 1967 (Fonte: Archivio del Moderno, AFR).

 

 

4.2 Projeto

Os arquivos dos arquitetos e engenheiros, doados ao Archivio del Moderno, são extensos, esclarecedores e deslumbrantes na revelação da manifesta intensidade, empenho e dedicação de toda a equipa. Esta doação permite a recente publicação da monografia já supracitada, Il Bagno di Bellinzona, assim como esclarece todo o processo de execução, podendo contribuir para uma eficaz salvaguarda deste exemplar arquitetónico. Juntam-se alguns desenhos representativos das várias fases de execução, como exemplo do trabalho exaustivo aludido, doados ao Archivio del Moderno.

Figura 23 – Planta Geral, Proposta de extensão do Passadiço, novembro 1967 (Fonte: Archivio del Moderno, AFR)

Figura 24 – Alçado sul, março 1968 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Def T 10/1).

Figura 25 – Alçado norte, março 1968 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Def T 10/2).

Figura 26 – Alçado, plantas e cortes dos vestiários e cabines, fevereiro 1968 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Def T 15/1).

Figura 27 – Planta Geral, Proposta, janeiro 1968 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21).

Figura 28 – Planta Geral, Proposta, abril 1968 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21).

Figura 29 – Planta, cortes e detalhes da piscina para crianças, fevereiro 1968 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Def T 13/1). 

Figura 30 – Planta da piscina para crianças com indicação com traçado, fevereiro 1968 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Es T 40/3).

Figura 31 – Planta, cortes e alçado lateral do escorrega da piscina para crianças, outubro 1968 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Es C 4/27). 

Figura 32 – Detalhes da piscina das crianças, novembro 1970 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti).

Figura 33 – Detalhe do corrimão do Passadiço, abril 1969 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Es C 2/6).

Figura 34 – Variante do parapeito, janeiro 1969 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, LG 21 Es C 2/12).

Figura 35 – Detalhe do corrimão do Passadiço, fevereiro1969 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Es C 2/3).

Figura 36 – Detalhe da pérgola,1969 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Es C 2/10).

Para melhor explanar sobre a evolução, hesitação e constante alteração do projeto, nomeadamente do passadiço, dos seus acessos e da implantação das piscinas com o respetivo programa intermédio, várias plantas sumárias são agora redesenhadas, para que se possa comparar de uma forma sintetizada e mais esclarecida, a evolução da proposta.

Figura 37 – Plantas Sumárias das propostas desenvolvidas entre setembro de 1967 até agosto de 1970, acrescidas da representação gráfica da situação atual (Fonte: Desenhos efetuados pela autora, a partir de desenhos das plantas do Archivio del Moderno, 2024).

 

 

Após a apresentação pública da proposta vencedora (09/1967), a equipa começa a esquiçar a extensão do passadiço (11/1967), confrontando-se com uma alteração de uma das premissas iniciais do programa de concurso, que se revela dispendiosa e complexa de se concretizar, como é a adaptação da pista de patinagem a piscina de verão. Outra alteração decorrente da crítica do júri, constitui a entrada que estabelece a ligação com a cidade. A mesma é apontada como muito estreita, devendo ser substituída por uma rampa. Os vestiários, que no projeto de concurso são caracterizados como elementos pré-fabricados de plástico, servindo de cabines de rotação, apresentam-se alinhados, formando um extenso filtro. Cabines circulares mais amplas, que servem as escolas vão perder esta configuração quase metabólica, para ganhar sustância espacial, na sua forma, luminosidade e detalhe construtivo.

Constata-se que os vários estudos que começaram a ser desenvolvidos, expõem intensidade e força, no desenho arquitetónico. Esta característica de colocar muitas vezes em causa o trabalho já desenvolvido, é várias vezes referido pelos arquitetos, manifestando coragem no ato de constantemente redesenhar e melhorar.

O posicionamento das piscinas vai sofrendo vários ajustes, decorrentes da afinação das dimensões e solução estrutural do passadiço. O conceito da água a passar sob a passadeira, muito desejada pelos arquitetos, vai aparecendo, como solução não prescindível, alusiva à memória comum, da adolescência, dos banhos de rio. Nesse sentido a piscina das crianças, organicamente desenhada, deambula numa dança posicional, nas várias plantas apresentadas. No entanto esta solução revelava-se tecnicamente difícil e dispendiosa, entrando em conflito com os pilares estruturais do passadiço e piso intermédio. A decisão final passa por destacar esta piscina e colocá-la próxima do combro a ser definido próximo do dique e do rio, executado com as terras provenientes da escavação das piscinas.

O projeto necessita de ser redesenhado para colmatar excessos económicos, não aprovados. Como acontece muitas vezes, a restrição permite chegar à essência. Os braços perpendiculares do passadiço central são removidos (01/1968), passando a ser identificados como elementos passíveis de serem construídos numa futura ampliação. As plataformas separadas do passadiço, para a zona do restaurante e respetiva esplanada, assim como a movimentação de terra prevista para esta solução, não são aprovadas, devendo esta área passar a estar incorporada na ligação direta com o passadiço, à cota intermedia. A piscina de saltos, que também se experimenta dissociada da piscina olímpica (04/1968), volta a estar próxima, para libertar espaço de relva e otimização de recursos.

O projeto supera vários desafios, impasses e restrições orçamentais. O maior impasse manifestou-se no referendo municipal, concretizado para viabilizar a expansão da área de intervenção. Galfetti menciona “foi realizado um referendo para esta obra pública, cujo resultado positivo do veredicto popular foi celebrado com uma procissão de tochas, um facto que regista uma sensibilidade singular de co-participação da opinião pública. O presidente da câmara da época, Mario Gallino, defendeu-nos muito, tomou como seu o projeto, pelo que houve também o que hoje chamaríamos de uma forte «tomada de consciência»”. [57]

Ultrapassada esta imposição, em setembro de 1968, a proposta é finalmente aprovada, definindo-se nesta altura a empresa de construção. É importante mencionar a importância que os engenheiros Guido Steiner e Enzo Vanetta, tiveram, em todo o processo, embora com responsabilidades distintas. O primeiro, responsável pela execução do passadiço e o segundo, responsável pela construção, a cargo da empresa Barizzi e Vanetta.

Outro momento importante será a apresentação do projeto a uma expressiva comitiva municipal e cantonal, em novembro de 1968, no atelier de Bedano. Os arquitetos confrontados com esta visita formal e significativa para a afirmação das suas capacidades em projetar este equipamento de grande complexidade e investimento económico, resolvem concentrar a atenção da comitiva numa maquete à escala 1:50, montada para o efeito no jardim do atelier. É importante realçar que o passadiço tem aproximadamente 375 metros de comprimento, o que resulta numa maquete com 7,5 metros de extensão. Nesta fase, a sua estrutura é apresentada com um pé infraestrutural, característico dos grandes eixos viários. Os espaços do programa, projetados sob este passadiço, apresentam-se estruturalmente suspensos ao mesmo.

Realça-se a influência, nos arquitetos, das grandes infraestruturas viárias, construídas na região de Ticino, enquadradas na paisagem como curvas de nível que se soltam da sua orografia, desenhando uma nova escala, como se pode destacar a intervenção de Rino Tami, na autoestrada Chiasso – San Gottardo, onde o betão armado da sua arquitetura se funde na montanha, passando a fazer parte desta. Esta união entre arquitetura e engenharia, observa-se presente na leitura do projeto das Piscinas. Os vários graus de conhecimentos, visualizam-se concertados numa composição de equilíbrio e não de combate de esforços, característica das obras de outros arquitetos de Ticino, como Livio Vachinni e Luigi Snozzi, com quem Galfetti e Flora colaboram.

Figura 38 – Flora Ruchat-Roncati e a maquete à escala 1:50, colocada no atelier de Bedano (Fonte: Archivio del Moderno 1968).

 

 

O perfil do passadiço irá ser obcessivamente redesenhado pelos arquitetos, desde o já mencionado pilar infraestrutural, como se de uma via rápida se tratasse, até se definir como uma lâmina de 0,30m x 1,50m, apenas em dois momentos cruciforme, para resolver deformações. A solução modular do passadiço, com 14,64 m de comprimento em cada fragmento, 3,90m de largura e 0,44m de espessura, começa a desenhar-se. Esta modelação, repetição e respetiva autonomia estrutural, começa a transformar todo o conceito do projeto, que indicava inicialmente mais diversidade e dependência estrutural entre elementos.

O que se vai depreendendo, com o afinar do conceito inicial, é uma elucidada solução programática e formal, permitindo que os arquitetos atinjam uma clarificação no desenho, na sua implantação, cada vez menos dispersa e mais controlada e respetiva depuração na sua pormenorização (08/1970). O tema da tectónica começa a prevalecer no desenho do passadiço, como uma infraestrutura que se junta e interliga, vivendo mais das relações de elementos arquitetónicos, do que uma entidade isolada.

A contrastar o ritmo regulador do percurso-tempo, como compasso na paisagem, contrastam os desenhos na planície, feitos de mancha orgânica, de desejo, de emoção, na sua relação com a água e com a arborização, que ao crescer começa a traçar essa incessante organicidade. Aliada a esta dupla intervenção junta-se uma terceira dimensão, a paisagem. Paisagem como mistura entre a génese urbana do lugar, a forte presença da topografia de Ticino, como são as suas montanhas e os seus elementos simbólicos, castelos e muralhas a delinear as encostas, numa nova composição.

As várias secções do passadiço, neste artigo redesenhadas, são analisadas para, de uma forma evidente, esclarecer o seu desenvolvimento, desde a fase de concurso (09/1967), passando pelas várias fases apresentadas ao município, nos anos que antecederam a sua construção (1968 e 1969), até ao momento da inauguração (08/1970), chegando aos dias de hoje (05/2024).

Figura 39 – Cortes Esquemáticos das propostas desenvolvidas para o passadiço, entre setembro de 1967 até janeiro de 1969 (Fonte: Desenhos efetuados pela autora, a partir de desenhos do Archivio del Moderno, 2024).

 

Considera-se importante esta representação gráfica, para de uma forma bastante elucidativa, aprofundar e comparar este elemento, inicialmente leve e quase desmaterializado, que ao longo do tempo vai incorporando peso quando submetido a resoluções estruturais, capazes de responder à distância, faseamento e processo de montagem desejado. A guarda do perfil do passadiço, na proposta de concurso, quase a desaparecer, ainda sem uma linguagem apurada, tanto é constituída por perfis metálicos horizontais como verticais, manifestando uma leveza intencional. A espessura do passadiço, ainda muito esbelta, forçaria a inúmeros pilares, na planície de intervenção (11/1967). Quando as preocupações estruturais e infraestruturais, como escoamento de águas pluviais e eletricidade, começam a informar esta importante peça, o seu perfil passa por várias transformações, num intenso desenho de variantes. É particularmente relevante a transição do seu desenho, no espaço temporal que antecedem a sua produção final (04/1968 e 01/1969). O seu piso ganha significado, na sua definição de betão compactado com ocos feitos in loco. Os arquitetos definem inúmeros desenhos possíveis para as guardas, em segmentos, visualmente fechadas, com betão, intercaladas por momentos de abertura visual, com estrutura de aço galvanizado. A iluminação começa a estar integrada. As questões de conforto, através das arestas boleadas e soluções de planos inclinados, para quem se detém a observar as provas de natação, demonstram o desejo exaustivo de atingir um grau depurado de conforto urbano.

A iluminação, propositadamente integrada com a guarda de aço galvanizado, permite que o passadiço possa ser utilizado em vários momentos do dia, demonstrando tratar-se de um eixo urbano, desejavelmente de grande mobilidade. Bancos de betão modulares aparecem nos perfis do passadiço, colocados na zona de contemplação da piscina olímpica. Desenham-se estruturas com finos perfis de aço galvanizado para a materialização de uma cobertura verde, passível de proporcionar sombra a quem assiste às provas de natação. As caixas de terra começam a pontuar o compasso desta estrutura, possibilitando o crescimento da referida trepadeira. Os arquitetos iniciam a demarcação do jogo das guardas do passadiço, alternando entre corrimãos de aço galvanizado, com painéis de betão, de duas alturas diferentes, colocados de maneira a proteger do vento ou apenas a proteger a vista de quem usa o vestiário, no piso intermédio.

A solução demarca uma importância tectónica apoiada na pré-fabricação dos perfis metálicos e dos perfis de aço galvanizado das guardas. As fixações são expostas, tornando-se elucidativas. Os painéis modulares de Thermolux, a criar ambientes controlados visualmente nos vestiários, de luz difusa, caraterizam estes compartimentos de uma pureza e conforto espacial. A modulação destes elementos irá permitir a sua substituição, consequente do seu intenso uso.

Todos os equipamentos, como bancos, bebedouros, assim como toda a sinalética, é desenhada pelos arquitetos, manifestando um obsessivo controlo de todos os elementos de projeto.

O detalhe do pavimento de réguas de madeira maciça de nogueira é sofisticado nas variantes do seu perfil, conforme a sua localização. É chanfrado para melhorar o escoamento das águas das chuvas ou cortado em forma ziguezague para impedir a visualização, a uma cota mais baixa, do interior dos vestiários. O perfil de madeira começa a ser exaustivamente usado no piso intermédio e na pavimentação das escadas. A sombra produzida pelo seu detalhe é esclarecedora da deliberada proporção métrica, que os arquitetos pretendem alcançar.

Figura 40 – Cortes Esquemáticos das propostas desenvolvidas para o passadiço, entre janeiro e março de 1969 (Fonte: Desenhos efetuados pela autora, a partir de desenhos do Archivio del Moderno, 2024).

Figura 41 – Corte dos painéis de madeira, colocados no pavimento, janeiro 1970 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Es T 36/4)

Figura 42 – Corte dos painéis de madeira, colocados no pavimento dos vestiários, janeiro 1970 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Es T 36/3).

Figura 43 – Detalhes da colocação da chapa ondulada sob pavimento de madeira e pormenor de calha soldada para escoamento das águas, fevereiro1970 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Es T).

Figura 44 – Detalhes da colocação do pavimento de madeira enos degraus das escadas, agosto 1969 (Fonte: Archivio del Moderno, AdM, fondo Aurelio Galfetti, LG 21 Es T).

 

 

O tema da pré-fabricação é introduzido para superar prazos de produção e facilidade de substituição, dado perspetivar-se uma utilização intensa, com o respetivo desgaste associado. A proporção métrica entre a secção dos vários elementos começa a fazer parte da justificação construtiva, onde as junções e todos os detalhes de fixação, bastante expostos, adquirem um valor esclarecer na mencionada importância tectónica. A depuração e clareza da solução final demarca uma verdade construtiva.

O plano de plantações evoluiu inversamente, partindo de uma racionalidade geométrica para se aproximar a uma organicidade florestal. Após experiências iniciais muito regradas na sua composição, o plano vai-se libertando de uma métrica urbana, ganhando características de parque. A presença abundante de água na planície aliada ao clima local, permite que as árvores, num período de 54 anos, tenham já atingido portes centenários. Os arquitetos estudam exaustivamente as espécies mais adequadas e compõem o plano de plantações a definir concentrações, linhas irregulares e pequenos bosquetes de espécies autóctones, características de uma galeria ripícola, como: plátanos, faias, freixos, ulmeiros, salgueiros, bétulas, choupos, carvalhos, sabugueiros, etc. Segundo Nicola Navone, os arquitetos colam folhas das árvores, nas paredes do atelier de Bedano, para melhor interpretarem a sua composição, no lugar.

Figura 45 – Plano de Plantações, 1970 (Fonte: Archivio del Moderno, AUTCB).

Figura 46 – Legenda do Plano de Plantações, 1970 (Fonte: Archivio del Moderno, AUTCB).

 

 

Voltando ao início do percurso, realça-se a inflexão do acesso ao passadiço no sentido da cidade para o rio Ticino. Este acesso, executado por uma suave rampa de muros esbeltos de betão, com espessuras atualmente difíceis de atingir (10cm), debruça-se sobre o Ginásio Cantonal de Alberto Camenzind e Bruno Brocchi, já anteriormente referido. Defendemos que ao considerar a arquitetura e o valor dos seus símbolos, o percurso estabelece uma inflexão intencional, para que este equipamento escolar seja observado, em confronto com os três castelos e a montanha, numa sucessão de planos cuja profundidade de campo manifesta uma intencional leitura territorial.

Figura 47 – Fotografia da maquete existente no Archivio del Moderno (Fonte: Fotografia da autora, 2024).

 

 

Depois da leitura da composição geral, passando pelo desenvolvimento da secção do passadiço, uma outra leitura essencial pode ser acrescentada, consistindo na representação do corte, onde este integra o programa, na cota intermédia e na cota da planície. Quando os vários pisos incorporam funções programáticas acontece a fusão entre infraestrutura e arquitetura. O corte revela-se fundador.

À estratégia inicial, de tornar os vários componentes verticalmente complanares, uma nova solução é apurada, convocando a visualização dos vários elementos e as suas junções, de uma forma evidentemente destacada. A luz atravessa os vários níveis, nas reveladas junções e a sua independência construtiva adquire um intento inaugural.

À plataforma de betão, com as suas esbeltas lâminas, justapõe-se, autonomamente, a estrutura de ferro, apoiada no solo, soldada e aparafusada, a manifestar o módulo e a sua repetição, evidenciando todas as suas junções. As paredes de tijolo maciço, de cor ocre, característica da região, apoiadas no plano da planície, implantam-se independentes e não complanares, deixando que a sombra e o destaque de cada elemento formem um novo léxico construtivo. Este manifesta o desígnio do significado, a liberdade gravítica realça as junções na composição arquitetónica, deslindando o seu processo construtivo.

Figura 48 – Corte transversal do Passadiço, março 1970 (Fonte: Archivio del Moderno).

Figura 49Cortes Esquemáticos das propostas desenvolvidas para o passadiço, com incorporação de programa no piso intermédio, entre maio de 1969 e março de 1969 (Fonte: Desenhos efetuados pela autora, a partir de desenhos do Archivio del Moderno, 2024).

Figura 50 – Cortes Esquemáticos da proposta desenvolvida para o passadiço, com e sem incorporação de programa no piso intermédio, agosto de 1970 (Fonte: Desenhos efetuados pela autora, a partir de desenhos do Archivio del Moderno, 2024).

 

 

4.3 Obra | Obra hoje

Tendo superado o mencionado referendo popular, as obras começaram nesse mesmo ano, 1968, permitindo a abertura ao público em agosto de 1969. Encontrando-se ainda incompleta, esta abertura veio permitir o acesso desejado e necessário às piscinas, não inviabilizando provas de natação. A inauguração oficial só seria realizada a 1 de agosto de 1970, embora ainda estivesse por concluir a ligação final, no limite do aterro do lado do rio Ticino, cuja construção só será iniciada no final de 1971.

O processo construtivo modular, veio permitir rapidez de produção e instalação em obra. A autonomia de execução, no aparafusamento dos vários elementos de ferro, revela-se certa também para a preparação, no estaleiro. A fabricação do pavimento de madeira, em painéis constituídos por várias réguas de madeira, ajusta-se também à necessária celeridade da sua montagem e eventual desmontagem nos meses de inverno. A pré-fabricação, modulação e aparafusamento na montagem contrastam com a construção dos planos de betão do passadiço, cuja treliça metálica, desenhada para estruturação da cofragem da peça, assemelha-se a uma empreitada de dimensão e complexidade viária.

O momento da inauguração manifesta a importância que esta obra tem para toda a região de Ticino e envolvente. Este equipamento irá marcar urbanamente Bellinzona e uma importante geração de arquitetos, que guarda a sua primeira visita como um acontecimento esclarecedor, um momento de encantamento, revelador da importância que a arquitetura tem e terá no lugar.

Numa primeira fase, logo após a sua inauguração, o passadiço apresenta-se, na proximidade com a piscina olímpica, pontuado por bancos de betão conjugados com a referida estrutura metálica onde a trepadeira timidamente aparece e respetivas caixas de terra. A vegetação no plano de planície, ainda amiúde, não tem porte capaz de produzir sombra.

Estes elementos que pontuam a passadiço são gradualmente suprimidos ou recolocados, permitindo uma leitura cada fez mais límpida do percurso de betão. A estrutura de perfis de aço galvanizado, desenhada para o crescimento da trepadeira é suprimida, revelando-se supérflua. A proposta evidencia-se cada vez mais depurada e esclarecedora.

Figura 51 – Cortes Esquemáticos da proposta construída para o passadiço, no momento da inauguração, agosto de 1970 e nos dias de hoje, junho 2024 (Fonte: Desenhos efetuados pela autora, a partir de desenhos do Archivio del Moderno, 2024).

 

A vegetação autóctone, que envolve todo o percurso, atinge um porte exuberante, permitindo a supressão dos referidos elementos de ensombramento. A sua preponderância no significado do projeto, apresentada nos cortes da proposta de concurso, atinge agora a dimensão desenhada, assumindo a importância da paisagem como fator cultural de inserção e relação com o lugar e como fator temporal no seu significado.

O passadiço revela-se no inverno, quando as folhas caducas denunciam este gesto infraestrutural na paisagem e esconde-se no verão, quando a sombra o protege, passando a ser a vegetação a dar seguimento longitudinal, no desenho de continuidade topográfica.

Nas décadas que se seguiram, alguns materiais, consequentes do seu desgaste, foram substituídos, como as réguas de madeira maciça trocadas por deck de compósitos de madeira. A alteração da sua secção veio modificar proporções e equilíbrios métricos anteriormente alcançados. A sua sombra na planície altera-se, assim como a sua coloração.

Após a classificação da obra como de interesse cantonal, em 2010, passa a haver meios económicos para sua urgente salvaguarda. O projeto de recuperação inicia-se em 2019, revelando aos dias de hoje, uma limpeza e recuperação importante dos elementos de betão, no passadiço, escadas e rampas. É também visível o tratamento e substituição das guardas de aço galvanizado. Outras decisões esperam-se que sejam também futuramente tomadas, como a substituição dos pavimentos danificados ou já adulterados, para que o desenho dos pavimentos seja restituído da sua materialidade e métrica original. Deseja-se também que o acabamento em betão, tão ambicionado pelos arquitetos, nas várias piscinas, possa também ser restituído e volte para avivar as referências iniciais da equipa, que ao homenagear Le Corbusier, mantem também viva a memória coletiva da infância dos autores, onde a pedra do rio, já muito polida, se conjuga numa simbiose natural com a pedra talhada das pontes romanas. O engenho a demostrar-se vivo, em diálogo com a paisagem, a refundar o lugar.

Figura 52 – A construção do passadiço, 1969. Nota-se o detalhe do encaixe de cada parcela, executada in loco, assim como a treliça de ferro, para cofragem da mesma (Fonte. Archivio del Moderno, ALG, AUTCB).

Figura 53 – A construção da estrutura metálica, 1969 (Fonte. Archivio del Moderno, ALG, AUTCB).

Figura 54 – Vista do passadiço, a partir das escadas de acesso ao aterro, 1971 (Fonte. Archivio del Moderno, ALG).

Figura 55Vista do passadiço, a partir das escadas de acesso ao aterro, 1971 (Fonte. Archivio del Moderno, ALG).

5. Ecos e Influências

Logo após a construção das Piscinas, Aurelio Galfetti e Flora Ruchat-Roncati juntam-se a Mario Botta, Tita Carloni e Luigi Snozzi (o denominado grupo Ticino), na elaboração da proposta de concurso para o Plano Diretor do novo Politécnico de Lausanne. A proposta, submetida em 1970, não selecionada, comprova influências evidentes entre o gesto infraestrutural das Piscinas, na sua inserção territorial em Bellinzona, com a proposta para o Plano do Novo Politécnico de Lausanne, onde os fortes eixos (norte-sul e este-oeste) estratificam usos, sobrelevando funções, convocando soluções evolutivas no plano térreo.

O eixo norte-sul da proposta é particularmente esclarecedor, na utilização de uma ligação pedonal sobrelevada, como elemento estruturante do projeto. É formado por duas lâminas laterais, incorporando alojamento de docentes e estudantes. Entre as lâminas, várias funções comuns acontecem, como salas de exposições, biblioteca, restaurantes, lojas, entre outras funções comunicantes, interligadas pelos referidos percursos pedonais suspensos. A experiência formal e programática das Piscinas encontra-se claramente a ecoar na procura de novas soluções capazes de suplantar, num gesto infraestrutural, leituras territoriais, na criação de novos modelos de paisagens urbanas.

Figura 56 – Proposta de Concurso, publicadas na revista Werk, nº 10, fascículo 57, outubro de 1970 (Fonte: E-Periodica – Das Werk : Architektur und Kunst = L’oeuvre: architecture et art – Umfrage zur Architektenausbildung © Das Werk. 1970, 57 (10)).

 

 

Uns anos mais tarde, Álvaro Siza Vieira, confrontado com a influência do tecido construído da cidade de Évora e as suas reminiscências romanas infraestruturais a marcar a escala do território, inquieta-se ao identificar linhas de água a atravessar a área de intervenção do futuro Bairro da Malagueira, transpondo esta inquietação através da inserção de um elemento complexo, redesenhado compulsivamente, algumas vezes descrito como conduta, outras vezes como aqueduto, no plano geral para o bairro da Malagueira. Este elemento sobrelevado, que conduz eletricidade, água, gás e telecomunicações, é várias vezes desenhado, nos esquiços de Siza, como transponível e apto a ser percorrido. Finalizado apenas como conduta infraestrutural, é construído com blocos de cimento, na procura de uma economia de meios aliada a uma repetição modular, a permitir rotações, variações altimétricas, numa intencional leitura territorial a compor um elemento refundador da paisagem. Como refere Rodrigo Lino Gaspar, de modo provocador, no seu artigo [58],

“O aqueduto dá corpo ao que Álvaro Siza descreve como uma outra escala ou a introdução de uma nova complexidade. O resultado é um elemento autorreferencial, uma pré-existência artificial – um corpo contraditório que levanta mais questões do que dá respostas. Deveríamos considerar a Malagueira um exemplo de como construir cidades resilientes?”

Podemos estabelecer leituras paralelas entre as Piscinas de Bellinzona e o Aqueduto da Malagueira, no gesto infraestrutural, que ao suplantar a escala da área de intervenção a relaciona com o desenho do território. A paisagem informa a arquitetura para que ela desenhe a infraestrutura que comunica com o lugar.

Figura 57 – Esquiços de Álvaro Siza Vieira, sobre o aqueduto (Fonte: Drawing Matter Collection, 2512.1 | 2393.05)

Figura 59 – Planta, corte e alçado do aqueduto, Álvaro Siza Vieira (Fonte: Drawing Matter Collection, 3744.11).

Figura 59 – Planta, corte e alçado do aqueduto, Álvaro Siza Vieira (Fonte: Drawing Matter Collection, 3744.11).

Recentemente, na aula que apresentou na EPFL, em outubro de 2023, Nuno Brandão Costa esclarece ter visitado as Piscinas de Bellinzona no início dos anos 1990, enquanto colaborador do atelier Herzog & de Meuron, em Basel. Essa visita terá sido significativa para contribuir, tal como o próprio refere, como influência para a definição da sua proposta de concurso para o Terminal Intermodal de Campanhã. Um gesto coeso infraestrutural, capaz de interligar um território fragmentado, marcado por uma densa estrutura ferroviária, constituiu a estratégia de atuação reforçada com a criação da denominada galeria lúdica, não especificada no programa de concurso, tal como o passadiço das Piscinas constitui um espaço de movimento e permanência, fora do programa original. A secção transversal da proposta deste complexo intermodal é esclarecedora na ideia de convocar uma integração programática sob um percurso estruturante no lugar.

Na crítica para o número 262, da revista J-A Jornal Arquitectos, publicada em outubro de 2022, intitulada Terminal Intermodal de Campanhã (TIC): Arquitectura do Território, Luis Tavares Pereira e Teresa Novais mencionam que a “face visível do TIC é como uma muralha, de secção variável e limite superior constante, que se vai ajustando quer à topografia, quer à funcionalidade. Esta estrutura estabelece um limite muito definido entre a linha férrea e a cidade a oriente.” Mais referem que o TIC “é um parque natural. A nova topografia é um trabalho de naturalização que cria um ambiente harmonioso de relações entre edifícios e malha urbana, onde antes existiam tensões e ruturas várias.”

Os arquitetos especificam que “Nuno Brandão refere-se ao aqueduto infraestrutural do conjunto habitacional da Malagueira e ao edifício-ponte das Piscinas de Bellinzona, com imagens que acompanham o dossier do concurso. Em ambos, trata-se de um elemento urbano contínuo que confere unidade, escala urbana, serviço e ligação entre elementos do território.”

Figura 61 – Diagrama da Proposta para o TIC – Terminal Intermodal de Campanhã, de Nuno Brandão Costa (Fonte: www.brandaocosta.com/projetos/tic-terminal-intermodal-de-campanha/?d=projeto-1)

Figura 61 – Diagrama da Proposta para o TIC – Terminal Intermodal de Campanhã, de Nuno Brandão Costa (Fonte: www.brandaocosta.com/projetos/tic-terminal-intermodal-de-campanha/?d=projeto-1)

Nos exemplos escolhidos, pode-se aludir que todos acompanham o mesmo significado, apoiados na leitura do território. Mencionando a interferência territorial, considerada muito importante para Vittorio Gregotti, ao defini-la representativa, não apenas como uma formal integração, mas na linha de continuidade da história em que um arquiteto executa a sua arte “se é na geografia que os sinais da história se consolidam e sobrepõem numa forma, o projeto arquitetónico tem a missão de chamar a atenção para a essência do contexto ambiental por meio da transformação da forma”. [59]

Essa continuidade com a história passa então, com a transformação feita pelo arquiteto, do território para a arquitetura, criando assim uma linha de continuidade entre o lugar e a construção, “a essência física da história é o ambiente construído que nos cerca” [60] mais aponta, “a geografia é a descrição de como os sinais da história convergem em formas, por isso o projeto arquitetónico tem a missão de revelar a essência do contexto geoambiental mediante a transformação de sua forma. O ambiente não é, portanto, um sistema em que a arquitetura se dilui. Ao contrário, é a matéria mais importante para desenvolver o projeto.” [61]

Podemos deste modo realçar, na conexão estabelecida, uma leitura estruturada e integrada, onde a acutilância a várias escalas, se alia à tectónica e ao seu significado. Kenneth Frampton, nos seus Studies in Tectonic Culture, define “os arquitetos podem voltar à unidade estrutural como essência irredutível da forma arquitetónica”, “não numa alusão à revelação mecânica da construção, mas à manifestação de uma estrutura potencialmente poética, no sentido original da palavra grega poiésis, como ato de criar e revelar.” [62]

 

 

6. Conclusão: Paisagem | Arquitetura | Infraestrutura

Conclui-se que a toda a força do projeto, na paisagem, se encontra sumarizada no gesto linear do passadiço. O seu perfil, com a sua clareza construtiva e programática, a diferentes alturas, reforça a construção do lugar. Não se desconsidera a intervenção na planície, na incorporação dos espaços onde a água predomina, no entanto, pelo facto destes equipamentos se apresentarem dissociados do passadiço, conferem a este elemento a força de um denominador comum, elemento fundador capaz de ligar a cidade ao rio.

É importante relevar a denominação que os autores atribuem ao projeto: Il Bagno. Mais do que Piscinas, a palavra italiana Bagno remete para um só elemento, uma só ação. A sua designação confere ao passadiço a ideia onírica de convocar a caminhada, o percurso para chegar ao tão saudoso Bagno de rio. Assim regressa-se ao tempo livre de Umberto Eco e Vittorio Gregotti, na intervenção Caleidoscópio, em que os espelhos apelam à paisagem montanhosa, pontuada pelos castelos e pela cidade. A interpelação do caminhante consiste em transportá-lo para uma dimensão de espaço-tempo, uma categoria de espaço que se transforma sem deixar de existir, por se tratar do espaço que convoca a interrogação. Ultrapassadas várias décadas, passadiço e plantação garantem agora o diálogo desejado, na sua clarividência de fazer o lugar.

A importância do módulo e da sua repetição, em toda a sistematização da sua execução, dialoga com a intensão dos arquitetos em desenhar a envolvente urbana, mesmo que lhes seja apenas solicitado um equipamento. O passadiço, ao ganhar um cunho infraestrutural, desenha cidade e não um viaduto, conferindo-lhe escala. A plataforma do passadiço, constituída por módulos de 14,64m de comprimento por 3,90m de largura, a 6,00m de altura da planície, assemelha-se à escala de edifícios, sendo esta proporção a que torna decifrável toda a proposta. A sua sucessão contínua transfigura-se na escala que suplanta a homogeneidade da cidade. A estrutura metálica, do nível intermédio, ao incorporar programa, introduz a esta tectónica da repetição do módulo, uma dialética transitória, admitindo com o tempo ajustar-se a melhoramentos e modificações necessárias. O projeto subverte a escala para que a mesma se molde à proporção da parcela, na continuidade do desenho do tecido da cidade. A lógica sistematizada intenta a ideia consciente de temporalidade. A cidade cresce e transforma-se, continuando o equipamento sempre a fazer parte dela, tal como as muralhas de Bellinzona.

A construção é recuperada, numa continua premência de cuidados de manutenção, com mais ou menos rigor, na autenticidade da sua execução. A obra continua a revelar, na sua sintaxe, a importância da junção, constituindo um percurso macio e áspero na sua textura, escuro e claro, na sua transparência ou solidez, mantendo vivo o jogo entre junção e rutura, como significado de conexão.

Martin Steinmann diz sobre a obra,

“volto ao que é, provavelmente, o ensinamento mais importante da Escola do Ticino: a relação entre edifício e lugar, a noção de lugar entendida no amplo significado que a arquitetura recente em Ticino lhe conferiu. Foram dadas diversas definições dessa relação, mas todas convergem para a conclusão de que, ao construir num lugar, estamos a construir o próprio local. Noutras palavras, cada edifício construído faz algo novo no lugar. Se há uma obra que assume, com a máxima clareza e beleza possível, a responsabilidade que deriva desta definição, é justamente o Banho de Bellinzona. Falou-se do “edifício fundador” da arquitetura recente de Ticino. Pode ser. O que é certo é que o Bagno torna evidente, de maneira exemplar, o que significa “construir o lugar”. Ou seja, a nova construção revela aquelas características do lugar que, provavelmente, não teriam sido reconhecidas antes de sua realização e que agora, ao invés disso, são identificadas como características constitutivas.” [63]

Galfetti concluiu, ao abordar a obra passados vários anos que “a reflexão que surge ao olhar com maturidade para o resultado do Banho público de Bellinzona é que se tratou de um projeto piloto baseado num conceito inovador de espaço à escala territorial. Capacidade demasiadamente pouco expressa pela cultura arquitetónica, apesar de todos os ensinamentos de Le Corbusier e do Movimento Moderno.” [64]

A obra continua e continuará, tal como o aqueduto romano ou as muradas de Bellinzona, a fazer o lugar. Mesmo não tendo ainda superado séculos, consegue ser estruturante ao ser maleável, conseguindo incorporar alterações sem perder identidade, pela força do seu ato fundador. Ao roubar-se a Louis Kahn a ideia de que os arquitetos devem ser compositores, sente-se nesta obra a preposição da composição, na ligação de elementos, na definição de um gesto a várias dimensões: uma envolvente orgânica, acompanhada de uma conjugação tectónica, sob uma estereotomia pesada. Uma dialética constante entre pesado e leve, permanente e transitório. E nesta composição, volta-se à Paisagem, Arquitetura e Infraestrutura, como trinómio alcançado, que recupera a dimensão do eterno retorno.

Figura 62Muralhas do Castelgrande em Bellinzona (Fonte: Fotografia da autora, 2024).

Figura 63 – Alçado Norte, 2009 (Fonte: Archivio del Moderno, ALG).

7. Piscinas de Bellinzona. Fotografias hoje (fotos da autora, 2024)

Figura 64 – Vista rampa de acesso ao passadiço.

Figura 65 – Vista da escola cantonal de Alberto Camenzind e Bruno Brocchi.

Figura 66 – Vista do passadiço. 

Figura 67 – Vista esplanada do restaurante

Figura 68 – Vista prancha de saltos. 

Figura 69 – Vista piscina das crianças.

Figura 70 – Interior dos vestiários.

Figura 71 – Vista longitudinal do passadiço.

Figura 72 Vista do passadiço.

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Arquivos

Archivio del Moderno, Balerna, Suiça

 

 

 

Notas

1. Rivista tecnica, revista mensal da Suiça italiana, de arquitetura e engenharia. Publicou a obra das Piscinas na sua edição a. 58, de novembro de 1967, nº 21, fascículo 660, pp.1377-1380, com o título Concorso “Nuovo bagno comunale – Bellinzona”

2. Bruno Reichlin (1941) arquiteto suíço, nascido em Lucerne, formou atelier com Fabio Reinhart, na década de 1970 e é desde 1984, professor de arquitetura na Universidade de Geneve. Arquiteto bastante influenciado pelas teorias de Aldo Rossi.

3. Diego Peverelli (1934) arquiteto e fotógrafo suíço, responsável pela primeira publicação das Piscinas, na revista Werk. Autor das primeiras fotografias publicadas sobre a obra.

4. Martin Steinmann (1942 – 2022) arquiteto suíço, formado na ETH de Zurique, foi investigador, professor e crítico de arquitetura, tendo sido responsável pela criação do arquivo CIAM, no instituto GTA, da ETH de Zurique.

5. Aldo Rossi (1931 – 1997), importante arquiteto e teórico italiano, considerado um dos responsáveis pelo movimento italiano, nascido há quarenta anos, La Tendenza. Movimento caracterizado por vários manifestos e definições, muitas vezes dispares, nasce da oposição à burocracia do funcionalismo, que segundo Massimo Scolari, no seu texto Vanguarda e Nova Arquitectura, nos diz que La Tendenza “recusa soluções interdisciplinares para a sua própria crise; que não persegue nem mergulha em acontecimentos políticos, económicos, sociais e tecnológicos apenas para mascarar a sua própria esterilidade criativa e formal, mas antes deseja compreender para poder intervir neles com lucidez – não para os determinar, mas também não estar subordinado a estes” (p. 5).

6. Mario Botta (1943) arquiteto e professor de arquitetura, suíço, nascido em Mendrísio, formado na IUAV Universidade de Veneza. Tem uma extensa obra construída, tendo colaborado, no início da sua carreira, com Le Corbusier, Louis Kahn e Carlo Scarpa. Criou, juntamente com Aurélio Galfetti, a Escola de Arquitetura de Mendrísio, da Universidade da Suiça Italiana (USI), para colmatar a inexistência de uma escola de arquitetura, no cantão de língua italiana, Ticino.

7. Luigi Snozzi (1932 – 2020) arquiteto e professor de arquitetura suíço, nascido em Mendrísio, foi um emblemático arquiteto de Ticino. Trabalhou em parceria com Livio Vacchini, sendo autor de vários edifícios importantes em Ticino, desde escolas, edifícios de habitação social, equipamentos desportivos, etc. A sua posição política socialista foi sempre muito vincada, demostrando sempre a sua preocupação social no seu papel de arquiteto.

8. Livio Vachinni (1933 – 2007) arquiteto suíço, nascido em Locarno, foi um importante arquiteto de Ticino, com uma vasta obra arquitetónica, desde escolas, edifícios de habitação, escritórios, etc, trabalhou em parceria com Luigi Snozzi e Aurelio Galfetti. Com Galfetti foi autor da Escola Secundária de Losonne, onde se visualiza o interesse pela tectónica no processo de criação de estruturas modulares. A sua arquitetura é bastante influenciada por Mies e Louis Kahn.

9. Casa Ruchat (1966-1967) em Morbio Inferiore, da autoria de Flora Ruchat-Roncati, Aurelio Galfetti e Ivo Trumpy, constitui um projeto representativo do atelier dos arquitetos, em Bedano. Construída em betão à vista, manifesta uma direta influência de Le Corbusier, não deixando de evidenciar uma importante plasticidade volumétrica interior e exterior.

10. Jardim de Infância Viganello (1965- 1971), em Lugano, da autoria de Flora Ruchat-Roncati, Aurelio Galfetti e Ivo Trumpy.

11. Jardim de Infância Bedano, (1972- 1974), da autoria de Aurelio Galfetti, é desenvolvido sobre os pressupostos pedagógicos de Montesorri, sendo todo o espaço comunicante. Galfetti menciona sobre este projeto que para ele projeto de espaço = projeto de percurso.

12. Casa Rotalini (1959- 1961) Bellinzona, constitui uma habitação unifamiliar, construída em betão à vista, implantada numa encosta bastante pronunciada, da zona montanhosa de Bellinzona. Galfetti descreve-a da seguinte maneira, no seu Livro Il progetto dello Spazio, “hoje pode ser vista como um objecto ou como um volume brutalista Lecorbusiano ou como um sólido escavado por preocupações formais, … ao projectá-la, porém, pensei sobretudo no seu espaço interno, certificando-me de que tudo o que compunha a macro e micropaisagem daquele local estava presente no interior da casa (tradução da autora de italiano para português)” (p. 20)

13. Irina Davidovici, publica recentemente o livro The Autonomy of Theory, Ticino Architecture and Its Critical Reception, GTA Verlag, ETH Zurich. Constitui uma importante e exautiva reflexão critica acutilante sobre a arquitetura de Ticino, a partir da sua divulgação e propagação, após a divulgação da exposição e respetivo catálogo publicação Tendenzen - Neuere Architektur im Tessin in Zurich in 1975.

14. Tradução da autora, a partir do artigo La “tendenza” dans le Tessin, Critique d’une expostition, escrito por Francesco Dal Co para a revista L’Architecture d’aujourd’hui, número 190, abril 1977, onde Dal Co menciona as Piscinas de Bellinzona como projeto que interpreta conscientemente a leitura do território de Le Corbusier. Texto original “Limpression que laissent les oeuvres réalisés, est loin de correspondre à ce qui a été présenté dans le riche catalogue de exposition Tendenzen - Neuere Architektur im Tessin. Lécart entre la réalité et sa representation y est frappant. L’ insitance théorique et les efforts idéologiques déployés par les auters du catalogue pour justifier leurs choix amenent une question: existe reelement dand le Tessin une production architecturale qui mérite un tel effort?” (p. 58).

15. Ibidem, texto original “Quant à Flora Ruchat, elle interprète conscinciensement Le Corbusier – dans la maison de Morbio, dans l´école de Riva San Vitale (réalisée en collaboration avec Aurelio Galfetti et Ivo Trümpy) ou dans le centre de loisirs de Bellinzona” (p. 59).

16. Ibidem

17. Tradução da autora, a partir do artigo Del Conocimiento a la Invención, escrito por Martin Dominguez, publicado na revista Quaderns d’Arquitectura i Urbanismo, em 1982. Texto original “Aquí tratamos de concebir la piscina como intervención unitária em el paysage, y no como una serie de elementos diversos del programa agrupados en una forma más o menos correspondiente a los prerrequisitos funcionales. Le Corbusier hablaba del acueducto romano como elemento que al superar la scala de las casas vecinas, no destruye, sino que acentua las cualidades del lugar. Tomamos pues la actitud de utilizar el programa como pretexto para proponer una intervención que buscaba intergrarse com el sitio, sino que intentaba darle a este una identidade más fuerte. Además, pensábamos que la paserela que reúne y organiza todos los elementos del programa era un elemento público, de paseo, pertencendo a la vez al sistema de murallas que definem el perímetro de bellinzona desde la Edad Media. Construimos, si quieres, un fragmento de muralla.” (p. 25)

18. Ibidem

19. Ibidem

20. Stanislaus Von Moos (1940) historiador de arte e teórico de arquitetura, suíço, nascido em Lucerne, professor em várias universidades suíças e internacionais, como Harvard e Delft, publicou vários livros e artigos sobre vários arquitetos como Robert Venturi e Le Corbusier.

21. Tradução da autora, a partir do artigo Castello Propositivo, Identidade, Memória e Monumentalidade em Ticino 1970-2000, publicado no catálogo MATIERE D’ART Architecture contemporaine en Suisse, texto original “Rossi emphasizes that the reconstruction of the Wall should serve, among other things, to create a link to the newly completed public pool design by Galfetti, Ruchat and Trümpy, whose project was probably conceived with Le Corbusier in mind (Plan Obus for Algiers, 1931) rather than Rossi. Might this be one of the few intersections, where Rossi’s and Le Corbusiers’s ideas converge?” (p. 169).

22. Il progetto dello spazio, de Aurelio Galfetti, Archivio Cattaneo, 2009, constituindo um texto consequente de uma aula realizada na USI, de Mendrísio.

23. Tradução da autora, a partir do artigo Il progetto dello spazio, de Aurelio Galfetti.

24. Nicola Navone (1967) arquiteto e professor, formado na ETH de Zurique, atualmente a lecionar nesta mesma instituição, atual sub-diretor do Archivio del Moderno, autor de inúmeros artigos relacionados com a arquitetura de Ticino, sobretudo com as obras ou biografias de Aurelio Galfetti e Flora Ruchat-Roncati, tendo sido colaborador de ambos. Podes-se destacar, dos vários artigos publicados, a monografia elaborada em coautoria com Bruno Reichelin, intitulada Il Bagno di Bellinzona di Aurelio Galfetti, Flora Ruchat-Roncati, Ivo Trümpy, já na sua terceira edição.

25. Franz Graf (1958) arquiteto e professor, formado na EPFL Lausanne, onde leciona arquitetura e construção, é responsável pela publicação Aurelio Galfeti. Costruire lo spazio. Escreve o artigo, com Monica Sciarini, intitulado La costruzione dell’architettura. Il restauro della costruzione, na monografia Il Bagno di Bellinzona di Aurelio Galfetti, Flora Ruchat-Roncati, Ivo Trümpy. A sua investigação centra-se no conhecimento dos sistemas construtivos modernos e contemporâneos e das técnicas de preservação do património do século XX. É desde 2010, presidente da Docomomo Suiça.

26. Tradução da autora, sobre livro já referido, de Irina Davidovici, intitulado The Autonomy of Theory, Ticino Architecture and Its Critical.

27. Kenneth Frampton (1930) publica, Modern Architecture: A Critical History (World of Art), Thames & Hudson, livro de extrema relevância para o discurso critico arquitetónico. Recentemente foram publicados textos seus alusivos a outras obras, não mencionadas nesta primeira publicação que o autor reconsidera como importantes de ser referidas. Esta última publicação é intitulada Kenneth Frampton, I’altro Movimento Moderno, editado por Ludovica Molo, pela Mendrisio Academy Press.

28. William J. R. Curtis (1948), professor, teórico e historiador de arquitetura inglês, publicou um importante livro para a disciplina, intitulado Arquitetura Moderna desde 1900, publicado pela Bookman.

29. Un dialogo ininterrotto. Studi su Flora Ruchat-Roncati, de Serena Maffioletti, Nicola Navove e Carlo Toson, publicado pela editora Il Poligrafo, em 2018.

30. Streets-in-the-air, termo utilizado pelos arquitetos e professores ingleses Alison e Peter Smithson, nos seus diagramas Cluster of streets-twigs that becomes a district: A net of ‘Streets-in-the air’, quando apresentam os seus conceitos de mobilidade, propondo percursos sobrelevados nas cidades, para criar mobilidades mais protegidas da velocidade viária, capazes de convocar conforto urbano. O casal Alison e Peter Smithson forma uma dupla importante, no discurso da arquitetura, na década de 1950, tendo contribuído para o grupo TEAM X, do qual faziam parte.

31. A proposta do concurso de Golden Lane, em 1952, dos arquitetos Alison e Peter Smithson torna-se emblemática, apesar de não ter sido vencedora, para um projeto de habitação coletiva. Com analogias diretas à Unité d’Habitation de Marselha, de Le Corbusier, a proposta desta dupla inglesa, constitui uma critica contundente no discurso arquitetónico, tratando o tema da mobilidade como novo pressuposto de operar, no projeto de construção de ligações nos tecidos urbanos.

32. Tradução da autora, de excerto do prefácio de Umberto Eco para a reedição do livro de Vittorio Gregotti, o Território da Arquitectura, de 1982 (p. 8).

33. Nicola Navone menciona este facto, na Interview to Nicola Navone, Archivio del Moderno, Balerna, 4 de junho de 2024, p.3, realizada pela autora.

34. Peppo Brivio (1923 – 2016), importante arquitecto suíço de Ticino, é autor de várias obras de referência, como edifícios de habitação e vários equipamentos coletivos. Estudou no Politecnico de Milão e mais tarde na ETH de Zurique, tendo colaborado com Vittório Gregotti. Participou no concurso para as Piscinas de Bellinzona, tendo ficado em quarto lugar.

35. Mat-Building significa uma estrutura de grande escala e alta densidade organizada com base numa rigorosa grelha modulada. Alguns estudos urbanos, de Alison e Peter Smithson, como a proposta para Kuwait, enquadram-se nesta definição.

36. Aurélio Galfetti, no seu artigo Quattro Progetti Incompiuti, Tranne Uno, incluído no livro sobre Flora, Un dialogo ininterrotto. Studi su Flora Ruchat-Roncati, menciona como se relacionavam com vários programas arquitetónicos, que lhes eram requeridos, levando mesmo a recusar algumas propostas, quando estas não respondiam aos seus propósitos éticos, sociais e urbanos.

37. Rino Tami (1908 -1994) arquiteto suíço, de Ticino, responsável por desenhar vários equipamentos públicos e habitações particulares. Pode-se destacar, do conjunto da sua obra, as suas intervenções infraestruturais, para a autoestrada de Gothard, tendo sido influente numa geração de arquitetos, que entendia que a intervenção arquitetónica, quando aliada à sua componente estrutural, potenciava a resolução de importantes gestos territoriais.

38. Nicola Navone menciona este facto, na Interview to Nicola Navone, Archivio del Moderno, Balerna, 4 de junho de 2024, p.2-4, realizada pela autora.

39. Ibidem

40. Tradução da autora, a partir do artigo Quattro Progetti Incompiuti, Tranne Uno, de Aurelio Galfetti, incluído no livro sobre Flora, Un dialogo ininterrotto. Studi su Flora Ruchat-Roncati, texto original “Una collabora-zione nata da una grande passione per l’architettura e dall’ammirazione di un grande maestro, Corbu, il nostro unico maestro” (p. 27).

41. Martin Steinmann menciona este facto, no seu artigo La Suola Ticinese all’uscita da Scuola, inserido na monografia Il Bagno di Bellinzona di Aurelio Galfetti, Flora Ruchat-Roncati, Ivo Trümpy

42. Ibidem

43. Tradução da autora, a partir do artigo Quattro Progetti Incompiuti, Tranne Uno, de Aurelio Galfetti, incluído no livro sobre Flora, Un dialogo ininterrotto. Studi su Flora Ruchat-Roncati, texto original “Corbu era, evidentemente, al centro dei nostri interessi, benché nelle nostre discussioni non mancassero i riferimenti ad architetti” (p. 27).

44. Ibidem

45. Ibidem

46. Tradução da autora, a partir do artigo Flora e Le Scuele di Riva San Vitale, de Ivo Trümpy, incluído no livro sobre Flora, Un dialogo ininterrotto. Studi su Flora Ruchat-Roncati, texto original “Sono aule molto generose, più ampie di quanto si usava fare allora, con finestre sui quattro lati per garantire una buona illuminazione e ventilazione naturale. Lo sguardo corre liberamente verso il villaggio a nord, verso la campagna a sud, verso le cime dei monti a levante e a ponente”

47. Alberto Camenzind (1914 – 2004), importante arquiteto e professor suíço, de Ticino, foi professor de Aurelio Galfetti e Flora, na ETH de Zurique, tendo sido co-diretor da EXPO 64, de Lausanne.

48. Bruno Brocchi (1927) importante arquiteto suíço, de Ticino, inicialmente colaborador de Alberto Camenzind, formando mais tarde parceria com este. Autor de inúmeros projetos relevantes de arquitetura, desde escolas a habitações unifamiliares.

49. Tradução da autora, a partir do artigo La Genesi del Progetto, de Nicola Navone, inserido na monografia Il Bagno di Bellinzona di Aurelio Galfetti, Flora Ruchat-Roncati, Ivo Trümpy

50. Ibidem

51. Ibidem

52. Tradução da autora, a partir do artigo Un paradigma di architettura territoriale, de Bruno Reichlin, inserido na monografia Il Bagno di Bellinzona di Aurelio Galfetti, Flora Ruchat-Roncati, Ivo Trümpy, texto original “Un’ imagine forte, che riassume perfettamente il loro concetto di Bagno: um percoso pubblico ancorato al território, solidamente costruito per durare nel tempo e offrire una tribuna da cui spaziare lo sguardo sul magnifico paesaggio, próximo e lontano” (p. 10).

53. Ibidem, texto original “Il Bagno di Bellinzona si trova dunque alla confluenza di alcune fra le linee più interessanti del pensiero architettonico del dopoguerra e le esprime con encomiabile chiarezza. Raramente cultura territoriale, pensiero urbanistico e architettonico si sono incarnati, nel secondo dopoguerra, in un progetto costruito: non dimentichiamo, infatti, che le proposte urbanistiche più interessanti e radicali degli architetti del Team X sono rimaste sulla carta. Opera insostituibile, unica nel suo genere, il Bagno di Bellinzona merita senza dubbio un posto di rilievo nel patrimonio architettonico mondiale del XX secolo.”

54. Plano Obus para Argel, desenvolvido por Le Corbusier e Pierre Jeanneret, a partir de 1930, para a cidade de Argel, na Argélia. O grande viaduto habitado, que resolvia todo o programa, terá certamente suscitado grande fascínio, na nova geração de arquitetos, profundamente influenciados por todos os esquiços, teorias, planos não concretizados e obras construídas, de Le Corbusier.

55. Plano para o Rio de Janeiro, realizado após visita de Le Corbusier ao Brasil, em 1929. O referido plano concentra também num só gesto, todo o programa, sobrelevando o volume do chão da cidade. No entanto este gesto aglutinador apresentava-se integrado com a orografia do lugar, a acompanhar a curvatura do terreno. Uma imponente resolução territorial a construir a poética do lugar.

56. Chandigarh, grande plano institucional, na India, construído em 1952, incorpora vários edifícios e monumentos de betão armado. Não tendo sido totalmente construído, o que perdura mantém-se símbolo de grande referência para o discurso arquitetónico Modernista. Isolados geograficamente, os edifícios transformam-se em objetos dissociados do seu contexto, não deixando de apresentar soluções plásticas radicais, de controle de ventilação e iluminação natural. O betão, neste exemplar arquitetónico, é explorado até á sua máxima organicidade.

57. Tradução da autora, a partir da entrevista realizada por Nicoletta Ossana Cavadini, em 2007, a Aurelio Galfetti, publicada no livro Il progetto dello spazio, texto original “È stato poi avanzato un referêndum per questa opera pubblica, in cui l’esito positivo che ne è usito dal verdetto popolare è stato festeggiato coon una fiaccolata pubblica, fatto questo che registra una singolare sensibilità di compartecipazione dell’opinione pubblica. Il sindaco dell’epoca, Mario Gallino ci há difeso molto, há fatto suo il progetto, quindi c’*e stata anche quello che dremo oggi una forte «presa di coscienza»” (p. 69).

58. Tradução da autora, a partir do artigo Aqueduct of Malagueira – Complexity or Contradition, de Rodrigo Lino Gaspar, para Drawing Matter, texto original “The aqueduct embodies what Álvaro Siza describes as another scale or the introduction of a new complexity. The result is a self-referential element, an artificial pre-existence – a contradictory body that raises more questions than it gives answers. Should we consider Malagueira an example on how to build resilient cities?” (p. 39).

59. Tradução da autora a partir do artigo Lecture at the New York Architectural League, de Vittorio Gregotti.

60. Ibidem

61. Ibidem

62. Tradução da autora a partir do artigo Rappel à l’ordre, The Case for the tectonic, de Kenneth Framton, publicado na revista Architectural Design 60, 1990.

63. Tradução da autora, a partir do artigo La Suola Ticinese all’uscita da Scuola, de Martin Steinmann, inserido na monografia Il Bagno di Bellinzona di Aurelio Galfetti, Flora Ruchat-Roncati, Ivo Trümpy, texto original “Torno a quello che è, probabilmente, l’insegnamento più importante della Scuola ticinese: il rapporto tra edificio e luogo, la nozione di luogo intesa nel significato ampio che l’architettura recente in Ticino le ha conferito. Sono state date diverse definizioni di questo rapporto, ma tutte convergono nella conclusione che, costruendo su un sito, si costruisce il sito. In altre parole: ogni edificio che si costruisce fa dí un sito qualcosa di nuovo. Se vi è un’opera che assume su di sé, con la massima chiarezza e la massima bellezza possibili, la responsabilità che deriva da una tale definizione, questa è proprio il Bagno di Bellinzona. Si è parlato di “edificio fondatore” dell’architettura recente in Ticino. Può darsi. Quel che è certo è che il Bagno rende palese, in modo esemplare, ciò che significa «costruire il sito». Vale a dire che la nuova costruzione rivela quei caratteri del luogo che, probabilmente, non erano stati riconosciuti prima della sua realizzazione, e che ora, invece, sono individuati come caratteri costitutivi.” (p. 40).

64. Tradução da autora, a partir do livro Il progetto dello spazio, de Aurelio Galfetti, texto original “La riflessione che nasce guardando com maturità l’esito del Bagno pubblico di Bellinzona è che si sai trattato di un progetto pilota basato su un concetto innovativo di spazio a scala territoriale. Capacità troppo poco expressa dalla cultura architettonica nonostante tutti gli insegnamenti lecorbuseiani e del Movimento Moderno.” (p. 69).